Saturday, November 08, 2008

Sábado animado

Até começar a escrever esse texto eu tinha certeza: indiano em espanhol é índio. Mas daí minha amiga leu e me deixou na dúvida. Em todo caso, pelo menos naqueles textos traduzidos do italiano pro espanhol, da agência em que trabalhava, vira e mexe aparecia um primer ministro indio, que na verdade era indiano. Erro dos tradutores ou não, a verdade é que se eu e as meninas já pegávamos carona nos programas de índio, o que dira nos da Índia.

A prova é que no sábado à noite lá estávamos nós, todas arrumadinhas, maquiadas, apostando ao máximo na tal festa de aniversário de um dos guardinhas australianos do trem de Perth. Quem chamou pra celebração foi o tal indiano, que conhecemos na volta do Halloween. Desde sexta passada ele tem sido presença e assunto constante de uma das meninas, por quem ele aparentemente se apaixonou. Nesse sábado, ele passou no trabalho de uma, depois na casa das outras e fomos todos pra Penguin Island, uma praia bonitinha, que pra chegar tem que ir de balsa ou se aventurar atravessando a pé, quando a maré tá baixa.

O passeio ainda incluiu um tour de barco pela ilha de leões marinhos. A moça que vendeu o ticket já tinha dito que nem sempre dá pra ver os tais sea lions, mas a gente deu sorte e viu... um dos bichos. Ele tava ali, estirado na areia, de barriga pra cima tomando sol. Nem respirar ele respirava direito. Até fiquei com medo que estivesse morto, mas daí ele piscou e, bem indolente, abanou a cauda, pra em seguida voltar a dormir.

Como todo bom romântico, o menino levou vinho pra praia. Deixou na água do mar por um tempo até gelar. Bebemos, tomamos sol, pegamos a balsa e o carro de volta pra Perth. Em casa, a gente se revezava entre dormir, tomar banho, fazer comida e drinks pra já chegar na festa feliz.

Durante toda a tarde, fiquei alguns momentos sozinha com o indiano enquanto as outras duas botavam o papo em dia. Por mais incrível que pareça, demorou até que conseguisse estabelecer uma conversa. Não sabia porque, mas desde a semana passada, quando ele foi conosco pruma exposição na City, eu não me sentia bem com ele. As meninas cogitaram uma possível TPM de minha parte, mas não era. Era uma semi-antipatia gratuita e recíproca. Eu não detestava ele, simplesmente não adorei o cara. E isso é tão difícil de acontecer que fiquei até me sentindo mal. Agora, analisando, talvez fosse orgulho, afinal depois do primeiro dia, no trem, ele não ligava a mínima pra conversar comigo e eu não tô muito acostumada com isso. O pensamento dele orbitava em torno de uma coisa somente: Big Boss! Apelido que a gente deu, brincando, pra outra menina e que ele aderiu completamente. Durante toda a semana, ele ligou pra ela algumas dezenas de vezes (em um único dia foram 21!), saiu de casa e ficou esperando por horas na porta do trabalho dela pra levá-la pra casa, ofereceu dinheiro pra ajudar a resolver o visto, comprar passagem e carro, além de tê-la pedido em namoro e casamento!!! E isso que nem date eles tiveram.

No dia da praia, depois de muito esforço, ele pareceu gostar de conversar e começou a contar sobre a vida, histórias e tradições da Índia, em particular de Punjab, de onde ele veio.

Punjab é uma região imensamente rica perto da Caxemira, como a gente pôde entender pelo mapa que ele tatuou no braço e mostra toda vez que fala de seu país. O idioma que eles falam tem o mesmo nome do estado. Segundo ele, na Índia se falam mais de 300 dialetos. O mais famoso deles é o Indi, mas nem todo mundo fala Indi. Por isso, a língua universal acaba sendo mesmo o inglês. "The Punjab Boys" são conhecidos em toda a Índia como um povo guerreiro e respeitado. O orgulho da terra natal ele ostenta por onde passa, com símbolos adesivados no carro, tatuados no braço e pendurados na enorme corrente de ouro que ele usa no pescoço.

Minha amiga acho que ainda não se decidiu se gosta dele ou não. Ele é dedicado, atencioso (até um pouco demais) e bonito (baixinho, meio bombadinho, cabelo raspado). Mas leva tudo a ferro e fogo. Se está apaixonado, só pensa na pessoa. Eu até tentei me segurar pra perguntar que ele dia ele faz aniversário. Essa história de taurina e pisciano há muito já perdeu a graça, mas ela também ficou curiosa. Resposta: 29 de fevereiro. Cansou, né?

A festa começava às 8h30. Saímos de casa às 10h, o que é um bom horário. A gente chegou e o moço ligou pro amigo policial dele, que já estava no lugar. O cara veio receber a gente na porta. Na frente da casa, um monte de carros estacionados, o que dava a impressão de que a festa estaria boa, quem sabe até com as 200 pessoas prometidas. Entramos e a primeira constatação foi "nossa, só tem homem aqui". Mas a gente logo viu que não tinha só homem. Duas mulheres de salto alto, tanguinha azul ou roxa e preta como tapa sexo, cabelo muito comprido, solto e peitos à mostra desfilavam pela sala. Como a gente foi descobrir depois, essas eram as garçonetes. "What can I do? This is an australian party, man", me explicou o amigo que trouxe a gente pra lá.

Conheci uma outra menina, essa convidada, vestida. Tinha mais umas três na casa. Ficamos um pouco na varanda, sentadas, até começar a tocar "Seigh is King" - uma música sobre Punjab que a gente já tinha quase decorado de tanto ouvir no carro. Fomos dançar todas empolgadas, entretanto meio distante do monte de indianos do lugar, que pulavam e usavam o taco de bilhar em suas coreografias.

Por três vezes eu pedi pro amigo me ensinar a dançar indian music, mas ele estava muito bêbado pra manter o mesmo pensamento por dois segundos na cabeça.

Jogamos bilhar, eu e as meninas, de três mesmo, sem muitas regras. Então, o resto da casa compensou a falta de atenção. Quando acabaram as bolinhas, fiz dupla com um indiano de meia idade, que me cansou em menos de uma partida. Pela primeira vez em muito tempo, pedi pra ir embora. As meninas gostaram da idéia, mas tínhamos que falar com nosso amigo.

Enquanto a gente não se resolvia, pedi pro dono da casa pra tirarmos uma foto com as garçonetes, que poucos segundos antes dançavam no colo de um dos convidados, imenso de tão gordo.

Elas estavam no quarto, se trocando. As duas eram simpaticíssimas e mesmo quando estavam servindo, pareciam mega à vontade sem roupa. Com frio, como constatou minha amiga, mas à vontade.

O aniversariante explicou que a gente era do Brasil e que por isso queria uma foto de recordação. Uma delas se desculpou e disse que não tirava fotos. A outra, mesmo já de calça jeans, aceitou na hora e ainda perguntou se a gente não queria fazer topless com ela. O "oh, no!!! I am fine" nunca foi espontâneo. Tiramos a foto as quatro, de pé em cima da cama do cara. Saímos do quarto, jogamos mais uma partida, dessa vez com o único loiro da casa, e então fomos embora.

Nosso amigo, de tão bêbado, nem conseguia ficar parado. Juntou uma trupe de uns cinco, seis guardinhas pra convencê-lo de que ele não poderia dirigir. Eu estava achando toda a festa muito louca e já me divertia, conversando com os moços. O amigo policial, muito, mas muito gente boa, ia nos levar pra casa. Entramos as três meninas no banco de trás do carro e o amigo ficava do lado de fora, se recusando a entregar a chave dele. Eu estava do lado da janela e perguntei pro motorista de podia roubar as tais chaves. Ele deixou. Eu abri o vidro e, toda feliz, arranquei o chaveiro da mão do indiano. Na pressa, quase arranco junto o fone do iPod.

Como não tinha mais como lutar, ele entrou no carro, veio nos deixar e voltou pra festa. Ainda ligou depois, queria dormir aqui, mas minha roommate, saturada, cortou qualquer possibilidade. No dia seguinte, uma mensagem no celular da outra, oferecendo carona pra casa dela. Quando as meninas olharam pela janela, foi aquele susto! O carro dele parado, ali na frente. Não ia nem dar pra fugir. Mas não era o carro dele. Era parecido, mas sem o enorme adesivo branco de uma frase em Punjab junto com o rosto de Singh (o herói deles que matou um general britânico depois de tê-lo caçado por 18 anos). Então não era o carro.

Ainda meio com sono, mas sem ressaca, eu fui descarregar as fotos da terceira máquina no computador. 805! Lógico que não era tudo de ontem, mas é mais fácil do que selecionar uma a uma. Pra dar bom exemplo, mostrei pras meninas que é bom apagar as fotos depois de descarregar e deletei todo o arquivo de ontem da minha máquina. Dois segundos depois lembrei que não tinha passado as fotos da festa, só as da praia. Idiota, mas, segundo opinião de todas, talvez tenha sido até melhor manter as imagens dessa festa só na nossa cabeça.

Sunday, November 02, 2008

Com ou sem festa, it is halloween

A tradição mesmo vem dos Estados Unidos. Quer dizer, eu acho, já que nunca vi nenhum filme de crianças londrinas brincando de trick ou threat. Mesmo assim, halloween já virou coisa comum no Brasil. É lógico que tem a galera contra e que, pra fortalecer a cultura brasileira, resolveu fazer do dia 31 de outubro o Dia do Saci. Eu, na melhor atitude antropofágica, não teria o menor problema em celebrar os ícones nacionais, mas como ainda não inventaram nenhuma atração extramemente divertida, como futebol pulando de uma perna só ou festas com pessoas vestidas de saci ou curupira, continuo indo a comemorações ao Dia das Bruxas.

E se eu fazia isso no Brasil, na Austrália não ia ser diferente. Infelizmente, não tenho a desculpa de estar no Hemisfério Norte, já que continuo abaixo da linha do Equador, mas eles falam inglês, então deve ter alguma coisa a ver.

Procurei mais ou menos, mas nenhum club grande de Perth fez propaganda de noite à fantasia - ao contrário dos de São Paulo, que me mandaram mil e-mails. As melhores festas eram as particulares e a gente acabou confirmando presença na dos meninos de Fremantle. Como acontece na maioria das vezes, sobre a festa mesmo, não tem muito o que contar. O melhor é a preparação.

Apesar de adorar bruxas, só fui vestida assim uma ou duas vezes. Sempre acho sem cratividade. Mas em outro país, halloween, resolvi arriscar. Comprei um chapéu laranja numa lojinha tipo Armarinhos Fernando que tem aqui. Paguei 3 dólares, mas não tava feliz. Num dia em que terminamos a aula mais cedo, fomos eu e minha roommate pra Second Hand shop - meu lugar favorito pra fazer compras. Levei entre outras coisas um vestido verde água mega curto de 12,50 (que pretendia usar pra ir de fadinha) e um chapéu preto, diferente, que não tinha o menor porque além de ficar legal com meu cabelo novo, acima do ombro.

Chegando em casa, depois de muito pensar, deu um clique e resolvi ir de leprechaun, em homenagem à loira irlandesa. Na verdade, percebi que era uma leprechaun e não sabia. Tinha todas as coisas que precisava, mesmo sem ter trazido nada de especial do Brasil. Peguei minha camisa branca, decotada e de babado, minha saia pregueada, o casaco verda compridinho, um cinto preto usado do lado contrário, a meia verde limão até o joelho que ganhei de uma amiga dois meses antes e que nunca tinha usado, meu chapéu novo customizado com um trevo de quatro folhas e um quadradinho laranja recortados do EVA que sobrou do meu mural e meu sapato de trabalho.

Um dia antes da festa, guardei tudo na bolsa, já que iria direto do trabalho pra lá.

No próprio 31 de outubro, parecia realmente que a bruxa estava solta. Quebrei o negocinho de dosar bebidas quando queria trocar a garrafa de Canadian Club, fiz confusão com os números do restaurante e ainda quebrei dois pratos quando fiz uma pilha maior do que deveria em cima da mesa. Meu novo chefe, um japonês estressado gerente de uma taverna na City, disse que se eu quebrasse mais alguma coisa ele me mandava pra casa. Eu cheguei a cogitar que talvez fosse melhor mesmo. Além do que, se fosse, conseguiria ir com as meninas pra festa, em vez de sozinha. Mas, depois do meu break, tudo melhorou e quando ele me perguntou se eu tinha quebrado mais alguma coisa eu respondi toda orgulhosa "não!!! Nem mais um único copo!!!". No final do dia quebrei mais um copo, mas foi quase dentro da lava louças, então ele não viu e nem eu me senti culpada.

Aquele dia o bar ficou vazio na hora do almoço, cheio no happy hour e vazio de repente. Melhor pra mim, que fui dispensada às 9h e consegui ir pra casa pra me trocar e ir com as meninas - minha sharemate, vestida de vampira, e a amiga dela de Fiji, se fantasia - pra estação de trem. Já na ida pra casa, fiquei feliz ao ver umas pessoas fantasiadas. Tem gente que pareceu que nasceu pra Halloween, como um casal que parece ter vindo do mesmo lugar que os caras do Manifesto, inclusive a mesma idade (uns 15, 17 anos), e que estavam todos de preto, maquiagem perfeita. A bolsa da menina era um caixão com corrente de prata e eles ainda levavam uma aranha de pelúcia como marionete.

As nossas fantasias, por sua vez, não chamavam menos a atenção e a gente ainda contribuiu tirando mil fotos dentro da estação. Um velhinho, sentado na cadeirinha da plataforma, disse ter adorado as nossas roupas e perguntou se a gente era turista, já que só foi lembrar ue era halloween uns 15 minutos depois. O cara nasceu no Canadá. Quando tinha os seus 20 e tantos anos resolveu fazer um tour pela Europa. Acabou o dinheiro, ele não queria voltar pra casa, comprou a passagem mais barata que tinha e que era pra Perth, Australia, um lugar onde nem café café decente tinha. Isso foi há mais de 30 anos. Desde então ele fica um pouco em cada lugar. Já morou em vários estados da Austrália, Europa, Ásia. Ultimamente, vive em uma casa paga pela Seguridade Social australiana. Casa boa, comida, tudo pago pelo governo, mas o lugar é tranqüilo demais, segundo ele. Dois australianos e um aborígene também vieram puxar assunto. Todo mundo adorando os lookings.

Encontramos a outra amiga na estação de Perth, demos meu chapéu laranja pra ela e rumamos pra Fremantle.

Em dias normais em Fremantle você já conseguiria ver pessoas fantasiadas. Ela é uma cidade pequeninha, cheia de europeus - ao contrário de Perth, que tem muito mais asiático - e, por causa disso, com muito mais gente louca. Quando íamos da estação pra lá, vimos uma festa de Halloween num club famoso e conhecemos algumas pessoas no meio da rua. Um menina, bem gordinha e vestida de fada, viu a gente de longe, veio correndo, parou na noss frente e, extremamente feliz, gritou "happppyyyyy hallooooweeeeeeeennnnnn", a quem eu correspondi com o mesmo entusiasmo. Uma outra apontou pra mim e disse, toda meiga, "look... a leprecoun", o que me deixou felícissima, afinal, minha fantasia tinha sido reconhecida.

Na festa mesmo, ficamos uma hora. Pouco antes da gente chegar, alguém derramou cerveja no computador do dono da casa. Isso junto com um desentendimento com outros brasileiros fez com que o clima não estivesse dos melhores. Os únicos que não deram o menor sinal de estresse eram os árabes, amigos deles, que não desempolgam por nada desse mundo e se divertiam absurdos colocando e dançando aquelas músicas esquisitas deles.
Na verdade, se a gente não tivesse chegado tão tarde, a festa estaria perfeita. Mas como à meia-noite nós éramos umas das únicas sóbrias do lugar, preferimos voltar à 1h30, pegar o último trem e voltar de táxi de Perth, o que daria $12 em vez de $50, $60.

Na volta, perdemos uma das meninas, que acabou não pegando o trem depois de demorar demais no Hungry Jacks. No caminho de volta, conhecemos o guardinha do trem, indiano, com quem conversamos o caminho todo e que nos deu uma carona pra casa. Economia de 4 dólares e mais um motivo pra adorar festas à fantasia.

Slipknot

Saindo da estação de trem eu percebi que estava vestida com a minha combinação de sempre pra shows de rock: calça comprida, blusa preta, tênis. A diferença é que dessa vez eu estaria do outro lado do balcão, vendendo as cervejas em vez de comprando.

Apesar de ser a cidade mais isolada dentro do continente mais afastado, Perth recebe uma quantidade considerável de shows. Parece que só este anos já estiveram por aqui Bon Jovi, Alanis Morissete, Celine Dion, Eros Ramazoti, The Police, Alicia Keys e, o mais recente deles, Slikpnot.

Até semana passada eu não sabia da existência desse show. Fui descobrir depois de um desses acessos de 'preciso arranjar outro emprego'. Tenho uma coisa dessas mais ou menos uma vez por mês, às vezes mais freqüente. Fui até o seek, site de emprego mais famoso daqui, e fiz uma busca pelas vagas no ramo hospitaleiro (que inclui bar service) e marketing (onde também entra a parte de promoção). Fui preenchendo ofertas até chegar nas de 15 dias antes. No meio do caminho encontrei essa empresa de shows e eventos. Fiz o cadastro, consegui um login pro site deles e me ofereci pra trabalhar no show, que seria em menos de uma semana.

Três dias depois me ligam. Estava no show! Não tanto por mérito meu. Apesar de já ter uma experiência considerável em serviço de bar, aqui faltam empregados, então se você tiver o tal RSA (Responsible Service of Alcohol, um curso obrigatório pra quem lida com bebida) já é meio caminho andado.

Diferentemente do que acontece no centro de convenções do cassino, onde o bar fica do lado de fora do lugar do show (como a bilheteria e o telão do cinema), em Showgrounds o bar fica dentro do próprio pavilhão, bem na entrada, mais ou menos como acontece no Brasil. São vários guiches e todos atendem em duplas. O cliente faz o pedido pro caixa, que tem um bar runner do lado. Enquanto o caixa cobra o valor, o bar runner pega o seu drink e abre a latinha. Todas as bebidas são em latinha, com exceção da água em garrafa ou copo de plástico (a primeira é vendida, a segunda, de graça).

A Austrália tem diversas leis pra inibir o consumo excessivo de álcool. Uma delas é essa do RSA, um curso que explica o valor alcóolico de cada bebida, dá dicas de como identificar se uma pessoa está bêbada e te avisa que se você vender álcool pra alguém bêbado ou menor de idade e ele aprontar, você pode vai ser indiciado também. Mesmo que a pessoa não faça nenhuma besteira, você e o bar serão multados em no mínimo mil e no máximo 10 ou 50 mil dólares.

Outra medida que eles usam é a de dar água de graça. Pra isso, além das garrafinhas, que custam $3,50, todos os bares, mesmo esses de shows ou feiras, distribuem copinhos com água corrente pra quem pede.

No show do Slikpnot, eu fui bar runner e passei cerca de 4 horas abrindo latinhas com a ajuda de uma colher de chá - meu chefe tinha pedido pra trazer uma de casa, mas como não tinha entendido a finalidade, trouxe só um abridor de tampa de garrafa, que acabei não tirando da bolsa.

Escolhi ficar como bar runner porque achava que assim ia dar pra conversar mais com os clientes e, portanto, seria mais divertido. Não é novidade pra ninguém que adoro gente bêbada. Acontece que eu não sabia desse esquema de ter que ficar atrás de uma caixa. No final, ela é quem conversa mais com as pessoas. Eu converso também, mesmo porque com essa altura pequeninha nem que eu quisesse ia conseguir me esconder atrás da loirinha. Além disso, os bêbados também gostam de mim.

No fim, bar runner é realmente mais cool. E isso nos dois sentidos da palavra. É mais legal porque é bem mais legal ficar correndo pra pegar e abrir quatro latinhas correndo do que simplesmente apertar quatro botõezinhos, mas também é mais cool porque durante vários momentos eu praticamente parei de sentir a minha mão de tanto que enfiava ela na água extremamente gelada pra tirar as latinhas.

Mais ou menos às 9 e meia da noite, alguém lá de cima resolveu fechar o bar. A platéia já estava ficando alterada, 'causando', na melhor gíria brasileira, então fecharam todos os caixas. Fiquei um tempinho enrolando e então fui ajudar o resto do povo a entregar água pras pessoas. 90% delas reclamaram que a não estávamos mais vendendo cerveja, mas, como não tinha outra coisa, vai água mesmo. Um, dois, três copos um seguida do outro e por fim outro jogado na cabeça. Alguns ensaiaram aquela zona de jogar água uns nos outros, mas não extrapolaram muito.

A água serviu mais pra acalmar os ânimos pela falta de cerveja, mas, segundo aprendi no meu RSA, de nada adianta beber água depois de ficar bêbado. Ela é boa antes, pra ocupar o espaço que seria destinado ao álcool e te fazer beber menos. Depois, com água ou sem água o tempo pra ficar sóbrio vai ser o mesmo.

Mesmo com a latinha de Tooheys Extra Dry custando $7 e o Bourbon and Coke a $9,50, o povo bebeu bastante e ficou revoltado com o fechamento antecipado do bar. Um deles vai ficar marcado como o meu primeiro cliente problemático.

O cara é grande, gordo, careca e com barba. A fisionomia lembraria o ferreiro (ou prefeito?) das histórias do Asterix. Também pode lembrar um pilar, de rugby, mas faz tanto tempo que não jogo que me sinto até mal de usar essas referências. Ele pediu cerveja, eu disse que não tinha mais e ofereci água, ele reclamou, como todo mundo, mas não quis a água e nem foi embora. Ficou falando meio sozinho, meio com o amigo, meio com a outra menina que tava trabalhando do meu lado, também ditribuindo água. Depois de um tempo, ela chamou os seguranças que só pediram pro cara ir embora e ele ficou mais irritado, mas foi. Eu tinha quase ficado com pena dele, achando exagero dela. Depois de cinco minutos, ele volta. Me pediu cerveja. Eu disse que não tinha. Ele então pegou um copo de plástico com água que estava no balcão e bateu na mesa. "Não, não, cerveja, não!". No momento em que o copo bateu na mesa, a água saltou do copo. Eu tranqüilamente dei um passo pra trás, mas só por dar, já que não ia ficar muito mais encharcada do que já estava, de tanto mexer com gelo e água.

Na hora me veio a imagem do gigante do 'João e o pé de feijão' batendo o pé fazendo riminhas pra dizer que "mim sente cheiro de humano". O cara e o amigo magrinho dele fizeram isso mais umas três vezes até que os seguranças vieram, conversaram e acho que os fizeram irem embora vencendo pelo cansaço, já que ninguém fez a menor menção de encostar no pequeno monstro.

Um pouco antes das dez e meia, meu chefe veio com o papel e a caneta pra eu assinar o ponto e ir embora. Saí da área restrita, fiquei mais cinco minutos, ouvi a última música enquanto conversava com um dos meus clientes da água (com esses sim, consegui bater o maior papo). Acabou o show, voltei pra casa de trem, como a maioria dos fãs do Slipknot. Na estação, uma menina me perguntou se eu tinha acabado com toda a água. Achei o máximo a simpatia dela e continuei conversando. Umas três frases depois, percebi que ela não era cliente. Tinha trabalhado comigo no final da noite. Mas australiana é tudo parecida. Das cerca de 20 meninas, só 4 (eu incluída) eram morenas. E entre as loiras a maioria tem o mesmo corte de cabelo, aquele todo, mas todo repicado. A tentativa é de deixar diferente, já que todas elas tem o cabelo lisinho e fininho. Como resultado, o cabelo fica com volume e com uma cara de desarrumado - o que não podia ter mais a ver com anos 80 e com esses shows em que me enfio.

Saturday, October 25, 2008

Acertando os ponteiros

Coloca a setinha no primeiro número, que é cinco. Dá três voltas no sentido horário. Agora gira no sentido anti-horário, passa uma vez pelo cinco e vai até o segundo número que é 27. Agora gira no sentido horário de novo, passa pelo 5 e vai pro terceiro número, que é 2. Por fim, é só tentar abrir.

Na verdade, o certo seria "por fim, é só abrir", mas como eu esqueci qual era o meu armário, eu repeti essa operação umas vinte vezes. Por vezes no mesmo cadeado, porque não tinha certeza se estava fazendo do jeito certo. Isso tudo às 10h30 da noite, depois passar as últimas quatro horas trabalhando no centro de convenções de Perth. Coisa fácil, só vendendo bebidas, todas em garrafinhas individuais, durante a entrada e o intervalo do show de uma cover qualquer do Abba.

Eu cheguei ali através de uma agência de trabalhos temporários. No dia anterior, aceitei dois shifs (dias de trabalho) pra semana seguinte e, já que estava tão solícita, ela perguntou se eu não queria trabalhar hoje em Burswood (onde fica o centro de convenções e o cassino). Eu aceitei, ela me passou os detalhes e depois de meia hora pediu desculpas, disse que eles diminuíram o número de funcionários e por isso eu não precisaria mais ir. Hoje, às 4 da tarde, outro funcionário me liga pedindo pra que eu fosse pro tal shift, já que alguém tinha desmarcado em cima da hora, como acontece com certa freqüência por aqui. Inicialmente, eu tinha que estar lá às 5h30, mas como isso era impossível, ficou marcado pras 6h.

Cheguei, de ônibus e trem, meio atrasada, correndo, como sempre. Peguei credencial, uniforme e cadeado, que tinha número, mas não adiantou, já meu armário estava sendo usado. Im, a menina que conheci no outro shift, me viu e veio falar comigo, toda feliz. Eu não lembrava dela, mas, graças àqueles meus momentos de "cuidado pra não ser grossa", preferi omitir esse fato. Ela me mostrou outro armário vazio, eu joguei as coisas lá dentro, aprendi a abrir o cadeado, fechei, fui encontrar com a supervisora.

Na volta, não lembrava o número. No máximo, sabia mais ou menos a posição dele em meio às dezenas de caixinhas prateadas. Várias pessoas vieram me ajudar, me mostraram como abrir os seus respectivos cadeados, mas todas com muita pressa pra ficar por lá. Im, por sua vez, é muito, mas muito baixinha e a única certeza que eu tinha é que minhas coisas estavam na fileira mais alta. Por isso, torcer era o maior apoio que ela podia me dar.

Fiz umas dez tentativas. Nada. De repente, força um pouquinho, abriu! Quando olhei dentro, simplesmente não era o meu. Analisei umas três vezes. mas nem era meu estilo de bolsa ou casaco. Fiquei o cadeado depressa antes que alguém percebesse que a delicada aqui tinha arrombado o armário dos outros. Tentei de novo os outros. Pior que nem abrir à força, como tinha feito com aquele, eu consegui. Tentei alguns mais pra frente.

Tinha tantos outros armários ainda, não ia dar certo esperar todo mundo sair pra ver qual sobrava. Me senti em São Paulo de novo, quando esquecia onde tinha deixado o carro. O problema é que dessa vez em nem sabia reconhecer meu carro. Uma outra menina veio me ajudar. Ligou pro meu celular, mas por mais que a gente encostasse o ouvido na portinha de metal, não deu pra escutar o celular dentro da bolsa, dentro do armário. As pessoas que passavam olhavam, estranhavam. Ela foi embora, ficamos só eu e Im. Resolvi tentar todos os cadeados, sem exceção ou esperança. Poucas vezes detestei tanto uma coisa quanto detestei esses cadeados. Se fosse chave, tudo seria mil vezes mais simples.

Algumas tentativas. Novo de repente, o cadeado abriu. Olhei pra Im com uma cara de "será?". Puxei a port do armário e lá estavam meu casaco e minha bolsa. Num acesso de felicidade que definitivamente não é minha cara, abracei a tailandesa de 1,50m que também pulava de emoção. A coitada estava morrendo de fome e tinha prometido me dar carona, já que às 11h da noite não tem mais ônibus pro trem e a primeira menina que ia me levar já deveria estar deitada há muito tempo.

Jantamos de graça no restaurante de funcionários e ela me deixou na estação de trem. Quinze minutos depois estava em casa. Ainda no carro, porém, soube que minha saga girando botoezinhos pra direita e pra esquerda não tinha acabado. Nesse mesmo dia, começou o horário de verão na Austrália. O relógio de patinho, porém, continua errado.

Monday, October 20, 2008

Fim do tempo de experiência

Nesse domingo, dia 19, fez três meses que estou na Austrália. Já? Ainda? Não sei qual a sensação mais apropriada. Nesses 90 e... dois dias que estou aqui aconteceu muita coisa, mas pouco a pouco tudo começa a entrar numa rotina, então vale a pena relembrar. A maioria dos eventos eu já relatei aqui de uma forma ou outra, então vou tentar não me estender muito, mas duvido que consiga.

Cheguei em Perth, fui pra homestay, comecei o curso de inglês, comecei a procurar casa, fui informada que estava no curso errado, troquei pra Management, arranjei uma casa, fui morar com minha amiga. No curso, já passei por cinco grupos, escrevi dois artigos de jornal, quase demiti uma menina, aprendi a desenhar usando vetores e voltei pra programas com mais recursos que o Paint, pra satisfação de Lucy.

A casa
Aqui fiz as maiores faxinas da minha vida (não que eu tenha muita experiência nisso, mas a casa estava realmente suja). Logo no primeiro final de semana passei mais de três horas limpando o banheiro. A janela tava emperrada de tanta sujeira. Delicada como sempre, acabei quebrando o vidro enquanto tentava abri-la. Já a cor da madeira mudou de cinza quase preto pra branco, na hora que saiu todo o pó impregnado.

Equipando mesmo, a gente foi aos poucos. A primeira compra foi de comida (pão, presunto e queijo), pratos (de papel) e produtos de limpeza. Com alguns dias de casa, recebi pelo correio um dvd player de presente do meu pai. Mas a TV é tão antiga que não tinha entrada de três fiozinhos, só aquela de tv a cabo. Comprei o tal Radio Frequence Modulator (cujo nome aqui é de verdade, sem nada a ver com organizações Tabajara), mas daí o dvd foi quem pifou. Passamos um mês assistindo filmes no note, até que hoje, depois de não aguentar mais ver propaganda e música alternativa durante a madrugada, fiz a reposição por outro aparelho, de 39 dolares, da marca Palsonic e que veio até com pilha pro controle remoto. A proximidade da China tem suas vantagens.

A casa é grande, bonita, mas no começo estava meio impessoal. Comecei a sentir que era realmente minha quando comprei meus vasinhos de flores e enchemos o lugar de fotos. No meu quarto, dois murais enormes. Um com fotos do Brasil (despedida e aniversário) e outro com fotos daqui. Na sala, uma da Coca e na geladeira, minhas e de minha roomate.

Contrariando a indignação do chinês, dono da loja, que insistiu que aquilo era coisa pra criança e não pra gente, o relógio vermelho do Patinho Feio deu todo o toque na parede da cozinha. Os pratos de louça (três no total), liquificador e batedeira a gente comprou relativamente rápido, já que minha amiga queria fazer sopas no liquidificador e eu bolos com a batedeira. A lava-roupa também não demorou muito pra chegar, graças ao vendedor solícito que trouxe a gente e o bicho pra casa. Ele, aliás, voltou aqui na semana passada. Bateu na porta do nada e perguntou se a máquina - de segunda-mão - estava funcionando bem. Não sei se ele estava esperando um convite pra entrar e tomar um café (cujo funil até hoje é a parte de cima de uma garrafa d'água cortada), mas chegou no pior dia possível. Eu estava no quarto, acabando a segunda mega faxina dessa casa, na qual fiquei três horas só tirando as três mãos de tinta do exaustador, já que os donos acharam mais fácil pintar o negócio toda a vez que pintavam a parede em vez de simplesmente limpá-lo de vez em quando. Minha amiga, por sua vez, se entretia tentando carregar três pratos de uma só vez, por conta do trabalho. No way da gente parar pra dar atenção pra ele.

Por fim, o rádio, cor de rosa, veio depois de um mês, como presente de aniversário pra ela.

Nessa semana, minha ex-homestay e as suas novas estudantes vêm comer aqui e a grande preocupação é comprar mais pratos, já que três pratos definitivamente não são suficientes. Quando os meninos vieram fazer feijoada aqui, um deles teve que usar prato cor de rosa de plástico pra poder comer todo mundo ao mesmo tempo. Por sorte, a outra amiga chegou mais tarde e pôde lavar um deles pra almoçar.

Com comida a gente se vira. Meu arroz com brócolis tem ficado cada dia melhor e o da minha amiga nem queima mais. Fora isso, macarrão (básico), linguiça, purê de batata, salada, muita comida semi-pronta, batatas, frango assado, grelhado, bife simples e a cavalo. A lista tem ficado cada dia maior e melhor. Mas como eu não tenho que provar nada pra ninguém e cozinhar pra muita gente dá trabalho, nessa quarta-feira vamos acabar na pizza mesmo.

Os australianos
É meio difícil definir um povo inteiro, então vou usar o mesmo texto, assim não fico tentada a entrar em detalhes. Na primeira balada que fui, passamos do lado de um grupo de australianos e minha amiga comentou "bonitos né, mas é só pra olhar". A maioria dos australianos, de Perth, pelo menos, não é de chegar e conversar. Principalmente não em balada. As australianas, pra compensar, são mega atiradas, dançam se esfregando nos moços e eles ficam numa boa. O problema - ou a solução - é quando elas fazem isso com brasileiros.

Aussies são muito de sair entre amigos. Fazem muito barulho e bebem muita cerveja. Nenhuma crítica nessa sentença, mesmo porque rola uma certa identificação. Já quando eles ficam bêbados, se tornam as pessoas mais sociais e explosivas do mundo. Puxam assunto mas também brigam muito - entre eles. O lado bom é que eles brigam só de soco. Ninguém usa arma de fogo ou mesmo faca. O lado ruim é que eles sabem onde bater. O tema de uma das propagandas governamentais que mais passa na TV diz "um soco pode matar", porque realmente tem gente que morreu com um soco dado no lugarzinho certo, entre o queixo e o pescoço, acho.

Por conta dessa insegurança, grande parte dos relacionamentos aqui começa pela internet. O da minha ex-homestay é só um exemplo. Por outro lado, é difícil ver australiano meeeesmo por aqui. Segundo estatísticas coletadas numa mesa de bar, só 30% de Perth é constutuída por aussies e a cada semana chegam cerca de 2000 estrangeiros na cidade. Até agora não conheci nenhum aussie antipático, principalmente entre os homens. "Friendly but not your friend", eles são legais, conversam, mas são poucos os que ficam realmente próximos de estudantes internacionais. Normalmente eles ficam no grupinho de conterrâneos deles. Por outro lado, há aqueles que tentam se relacionar quase que só com gente de fora e aprender o máximo de línguas possível. Esses são figuras.

O clima
Todo mundo diz que a Austrália parece com o Brasil, mas eu sou de São Paulo e vim pra Perth. Há três meses era comum a temperatura mínima ser 4 graus. Já essa noite, depois de um dia torrando (com protetor solar) na praia, eu não consegui dormir por conta do calor. Às 3h da tarde de hoje fazia 35 graus na cidade. E isso que nem chegou o verão. Não é à toa que essas meninas andam quase peladas.

Os bichos
Minha sharemate disse que vai fazer um álbum chamado "Patty e os bichos", de tanto que tirei (ou tentei tirar) foto com cavalo, ovelha, porco, rato e mais um monte de animais que encontramos numa feira de agropecuária daqui (o país muda, mas os programas de índio permanecem). Em homenagem a ela, resolvi incluir esse item no texto. Um dos maiores motivos pra eu ter vindo pra Austrália é por conta da preocupação do país com o meio ambiente. Estava certa. Em Perth ninguém fala em poluição (coisa que não acontece em Sydney, mas eu tô no interior, vou falar daqui) e pelo menos uma vez a cada quinze dias tem alguma notícia relacionada a bichos nos jornais. Já foi um tubarão que apareceu perto da costa, um bebê baleia que confundiu um navio cargueiro com sua mãe (e por isso ficou atrás dele por mais de uma semana, até que, quando estava quase morrendo de fome, foi morto pela Guarda Costeira), um canguru que foi torturado por um cara, que depois foi preso e um crocodilo gigante que engoliu um turista. Por mais que tenham procurado, só acharam a máquina fotográfica dele, na beira do lago.

Na nossa própria casa de vez em quando aparece umas aranhas. Já pesquisei e não se tem registro da última pessoa que morreu de uma picada de aranha por aqui, então, não mato, mas também não ajudo. Ontem uma delas morreu afogada enquanto eu tomava banho. Mas foi burra ela de querer passar debaixo do chuveiro. Em toda a cidade, calçada é só uma faixa de concreto no meio da grama que fica frente das casas. Na maioria das ruas elas ficam só em um dos lados. Só as avenidas têm calçada dos dois lados. Quando o dia está frio e úmido, os caracóis que ficam de um lado da calçada resolvem atravessar por outro de madrugada e a gente, indo ou voltando da balada, tem que ficar desviando pra não pisar. As lesminhas são tão grandes que minha sharemate brinca que é a invasão alienígena. Já a outra amiga, quando vai dormir em casa, prefere andar no meio da rua pra não correr o risco de ouvir aquele creck nojento. Das aranhas não tirei foto, mas se alguém quiser, dá pra ver até a gosminha que caracol deixa por onde passa. Qualquer dia faço um vídeo.

Thursday, October 16, 2008

Which clothes?

(texto escrito pro meu curso há uns dois meses. Como eu estudo Management e não inglês, se alguém quiser me dar toques de gramática, eu agradeço.

vocabulário útil: thongs = sandálias; rubber thongs = havianas ou alguma imitação delas)


At the first week of September, from 4th to 12th, takes place in Australia the Perth Fashion Festival. The event happens once a year and in 2008 completes its 10th edition. For this special date, there are many free attractions in and around the City, which emphases the idea that fashion isn’t restricted at parades. The real fashion is on the streets and reflects peoples’ life style. This, actually, is one of the first things international students note when they come to another country. Fashion can change based on which place you are and sometimes is good to be prepared to know what is and what is not suitable.

According the Polish Magda Korecki, International Students adviser of Tafe’s Art, Design & Media courses, people in Australia have too many styles, but the main ones are the Bush Wear, used by those ones that came from the country and decided to continue dressing themselves as cowboys and cowgirls, and the Beach Wear, stamped by shorts with flowers and more common specially now, when the Spring-Summer season begins.

“The Australians are very practical in the way of dressing. In Europe, for example, people are more formal. Here, there are not some many rules. The Aussies use what they want. If you feel comfortable, that is ok”. One example, explain her, are the thongs, specially the rubber ones. “Those shoes are very popular here. People use to have a lot, of many colours and use it in all occasions. It is part of the Beach Style”.

At evening, boys continue with the basic look, while the girls invest in a sexier and fancier choice, using very short dresses or dresses with not back, sparkling, silver, high heels.

When in Rome, do as the Romans do?

If you decide to mix your country’s style with the Australian’s one, Perth has brands for all tastes and wallets. Murray and Hay Street, at the City, have a lot of good stores. One of the most famous is Myers. On Fridays the stores remain open until 9 PM.

Who wants something more glamorous and also more expensive can visit the stores of Kings Street, also in the City.

If the idea is buying without spending much, there are others department’s stores as Target and Kmart with basic items - "they have nothing special, but have good prices" – and some discount shoppings. The Harbour town is most famous one, with a lot of outlets and sales. It is easy to go, close of West City Train Station.

For those ones who want to meet Perth more deeply while do shopping, the suburbs use to have some shopping centers. Almost all they are open until 9 PM on Thursdays.

Fremantle also have good opportunities. Its market has more than 150 stalls with clothes and jewellery, besides food and craft. It is open 7 days, normally until 5 PM and Thursdays until 9 PM.

Ahhhh, o verão

Não, o verão ainda não chegou, mas tá quase. E pra quem passou os últimos meses passando frio (por pura teimosia em não admitir que estava mesmo muito frio), esses últimos dias de calor em Perth têm sido uma bênção. Infelizmente, ainda não deu pra ir pra praia. O curso é mais puxado do que imaginava, então o meu tempo livre eu tenho passado na frente do computador, brincando de estilista ou de administradora. Mesmo assim, acabei descobrindo que essa casa vale cada centavo que estamos gastando.

A porta enorme de vidro dá pra avenida e do outro dela tem um parque enorme. Ainda não pisei no parque e acho isso uma vergonha. O problema é que, como graças à minha vida sem carro não tô precisando fazer muito esforço pra perder peso, correr por correr não é uma opção. Um dia, os meninos até vieram aqui com a bola de futebol, mas a feijoada que a gente comeu antes impossibilitou qualquer atividade física.

Sim, feijoada, futebol e brasileiros. Não parece, mas estou na Austrália. Nesse momento, deitada no sofá, olhando pro tal parque e ouvindo a versão forrozeada de Gilberto Gil pra Three Little Birds, do Bob Marley (pra possível surto de Lucy, que detesta o tal do reggae).

Dizem que o verão daqui é insuportável. Deve ser mesmo. As australianas já começaram a mostrar isso pelas roupas. Foi só sair um solzinho que todo mundo saiu de micro shorts. Micro mesmo. Os meus, que Lana Banger (agora assumidamente Paullette) dizia que eram de Carla Peres, são muito grandes! E não é exagero. A maioria das meninas é mais magrinha, então não fica feio. Todo o resto é bem gordinha (aqui parece que é tudo em extremos), mas elas usam as mesmas roupas (sobre as roupas daqui, escrevi um texto em inglês pro meu curso; é bobinho, bem texto de revistinha, mas dá uma idéia).

Toda vez que vejo uma dessas mais animadinhas, lembro da minha mãe, preocupada, enquanto eu fazia minha mala. “Pra que você vai levar essas coisas? Nem todo lugar é como o Brasil pra usar uma saia ou um shorts desse tamanho”. Pelo que vi, provavelmente, quando voltar, o discurso vai ser diferente “aonde você pensa que vai com uma saia desse tamanho??? Você não tá mais na Austrália pra se vestir assim”.

Exageros à parte, pouco a pouco, estou me libertando nas minhas calças jeans e, devidamente protegida com fator 60, volto a sair com as pernocas de fora. Elas ainda não estão boas, meio manchadas, pele bem branca por causa das queimaduras de três meses atrás, mas parece que o sol tem feito bem. Esse sol eu tenho tomado na porta de casa, nessa minha varandinha sem muros, sentada no chão com o note no colo, fazendo trabalhos.

Apesar da descrição maravilhosa (é mesmo), nesses últimos dias tenho sido uma leve falta do Brasil. Aqui é gostoso, mas quando está frio as pessoas não saem muito de casa e eu trabalho toda sexta-feira. As baladas durante a semana são boas, mas ainda não achei aqueeeeela festa, mesmo porque 90% delas terminam às 2h, mas esse assunto fica pra outro dia. Por ora, é muito bom perceber que o verão está chegando na mesma medida que meu curso acaba.

Tuesday, October 07, 2008

Tempos modernos

O que não é a tecnologia... Gossip Girls tem sido meu novo seriado favorito. O programa entra no ar na noite de segunda-feira, nos Estados Unidos e, terça-feira, já consigo baixá-lo para assistir em casa. Se esperar até quarta, daí já tenho o programa com legenda em português. E olha que a TV brasileira ainda está reprisando a temporada antiga.

Tudo bem, tudo bem, meus filhos conseguirão assistir a qualquer programa, no momento em que estiver sendo transmitido em qualquer lugar do mundo, sentados tranquilamente no banco de trás do carro enquanto vão para a escola... Mas vamos nos ater ao presente.

Quando nossos pais eram crianças, gente bonita era broto, diversão de moleque era carrinho de rolimã ou bolinha de gude e todo mundo podia brincar na rua, e roubar fruta do pé. O xingamento mais grave era viado e o maior perigo era ser atingido por uma pedrinha arremessada em um estilingue.

Passou tempo, revoluções, acabou guerra fria, caiu muro de berlim, criaram a internet, discoteca virou balada, nasceu o bebê de proveta... e nascemos nós também.

Pra não dizer que não brincava na rua, cheguei a brincar no jardim de casa, atrás do portão. Podia até levar as vizinhas, mas parei de fazer isso quando elas roubaram meu disco das paquitas.
Nunca me incomodou. Brincar na rua, claro, porque criei birra delas até hoje por causa do disco. Mas cresci ouvindo que a violência tinha roubado minha infância, que cresci trancada dentro de casa e por aí vai. Alguém me perguntou se isso me afetava?

Não temos rolimã, mas temos videogame; não tinha as ruas, mas a minha geração tem a internet, ou seja, o mundo todo; se não pego fruta do pé, vou ao SUPERmercado. CDF virou nerd, geek... e os carrinhos de madeira, as bolinhas de gude? Haha, joguinhos de computador, carrinhos de controle remoto, e até boneca que chora que nem gente.

A liberdade de brincar de pés descalços correndo no chão de terra batida não tem igual. Disso, não discordo. Mas liberdade também é poder comer gordura trans de um McNuggets com molho barbecue, poder passar horas conversando com uma amiga ou parente no exterior sem gastar um centavo, poder jogar videogame 3D com os melhores jogadores do mundo com as mesmas habilidades dos de carne e osso. Com a mesma cara e porte físico também. Ah, se comprar o joguinho pirata, ainda ganha uma narração do Galvão Bueno de brinde.

Liberdade é poder escolher qual é o besteirol quero assistir e a que horas posso assistir. E isso, só a minha geração pode se orgulhar de ter tido.

Por isso, se alguém disser que quando era criança o mundo era muito melhor, concorde. Mas isso não quer dizer que a infância dele foi melhor que a tua. Do que a minha não foi!
Agora me dá licença porque hoje é terça e eu já posso baixar o último capítulo de Gossip Girls.

XOXO

Wednesday, September 24, 2008

Surpresa!!!

Chega uma época na vida de todo mundo que a moda é festa surpresa. Muito mais fácil pro aniversariante e quase uma mostra de amizade de quem organiza. Essa quase não foi a tempo, já que eu e minha roommate já tínhamos combinado de fazer uma festa pra comemorar o aniversário dela. Mas daí a terceira amiga me veio com a idéia de festa surpresa - pra minha roommate e pra dela, que fazia aniversário dois dias antes (coincidência: uma taurina e uma virginiana em cada casa; a do dia 4 de maio com uma do dia 20 de setembro e a de 5 de maio com a de 22 de setembro). Eu concordei com a surpresa e a partir daquele momento, ajudada pelo fato de que ela não queria pensar em ficar mais velha, parei de falar abertamente do aniversário.

A festa ia ser no domingo. Meio da semana e nada estava pronto ainda. A virginiana da minha amiga já ia dar duas festas - às quais não pude comparecer porque estava trabalhando -, então ia ser complicado fazer seus amigos irem a mais uma comemoração. A festa virou só da minha, mas não ficou menos difícil por isso.

Eu e a loira (a daqui, não Lucy), passamos da fase de irmãs e viramos praticamente gêmeas siamesas. A gente mora juntas e estuda na mesma escola, por vezes no mesmo horário. Como não temos carro, sempre vamos ao supermercado as duas pra conseguir carregar as compras. Pra completar, ela trabalha no café da manhã, o que significa que só está fora de casa num horário em que nada está aberto.

Comprar as coisas escondido era praticamente impossível, então a gente teve que improvisar. A outra amiga aproveitou um dia que estavam as duas juntas e resolveu passar no mercado e compras coisas teoricamente pra casa dela. Depois, pediu pra deixar as sacolas em casa, já que ela ainda teria que ir pro trabalho. Comprou muita coisa e fez a coitada da futura aniversariante voltar carregada e sozinha.

As coisas pro bolo eu incluí nas compras da semana, o que deu uma ajuda. Mesmo assim, ainda faltou coisa, mas o acaso colaborou e no dia em que eu trouxe as bebidas pra casa ela estava dormindo à tarde. Tudo o que precisava ficar na geladeira eu fui enfiando dentro das sacolas da outra amiga, que ficaram mais de uma semana em casa na esperança de que ela viesse buscar. O resto, tudo pro meu quarto, no chão mesmo, debaixo de cobertores ou roupas pretensamente sujas. Um dia cheguei com uma caixa enorme debaixo do braço, mas joguei o casaco por cima e ela nao percebeu o presente. Já o rolo de papel de presente, deixei do lado de fora da casa até que ela fosse pro quarto e eu pudesse atravessar a casa sem perigo. Tudo estava dando mais ou menos certo.

Pro dia da festa, a outra amiga chamou nós duas prum almoço com uma brasileira recém-chegada, que fazia aniversário no dia 19 e que tem o mesmo nome da minha roommate (muita coincidência pruma história só). Eu inventei uma reunião de grupo como desculpa pra arrumar a festa. Tudo sozinha, já que a gente não arranjou outro jeito de tirar a moça de casa sem envolver uma de nós. Na verdade, a amiga que chamou pro almoço já não iria pro almoço. Ela tinha sido escalada pra trabalhar, mas só ia contar isso em cima da hora, quando as duas com o mesmo nome já estivessem esperando.

O almoço era às duas. Eu chamei as pessoas pra casa às quatro. Contando que ela saíria uns 40 minutos mais cedo, dava tempo. No domingo cedo dei uma pequena arrumada na sala, fiz meu trabalho de escola (que realmente existia, apesar de não ter reunião) e, fingindo que já estava indo pra reunião, fui comprar pães pros brasileiríssimos sanduíches de metro. Quando voltei, vi a cortina da sala aberta, o que só acontece quando tem gente. Liguei, perguntei se ela ainda estava em casa. Sim, ela estava. Perguntei se minha usb ainda estava no computador. Não estava, eu sabia. "Nossa eu não tô ach... AAAAI, ACHEI!!! Nossa, que bom, tava aqui jogada na minha bolsa, mas eu não tava achando. Só isso, beijinhos".

Liguei pra outra. "Oi, então... eu tô aqui na esquiiina de casa, sentada com a sacola de pães. Não... ela ainda não saiu de casa aiiiinda. Isso porque vocêee disse pra ela que era pra ela ir pro almoço de vocês, mas já almoçada, por que não era bem um almoço. Além disso, ela tinha que lavar a roupa justo hooooje, porque senão não ia dar tempo". Apesar dela ter pedido, eu não podia ligar de volta pra outra e mandar ela tomar nisso ou naquilo. Ela é que tinha que ligar, dizer que estava atrasada e que ela precisava sair correndo pra fazer companhia pra menina, que era nova na cidade.

Deu certo, mas eu não sei quanto tempo depois, já que não podia ficar olhando de tão perto. Meia hora depois de ter desligado, cheguei perto e pedi prum cara que tava passando bater na porta pra mim. Entrei e a casa ainda estava cheia de fumaça, o que significa que ela tinha fritado um hamburger antes de sair. Fechei a cortina, que ela esqueceu de fechar, coloquei a música no note e comecei a arrumação. Primeiro o bolo. Enquanto ele assava, fiz os sanduíches. Lavar alfaces, cortar. Depois tomates. Lavar, cortar. Toca o telefone. A indiana pedindo a 3a ajuda pro mesmo trabalho. Disse que estava ocupada, mas enquanto tentava entender o que ela falava, cortei meu dedo. Fiquei brava, cortei também a conversa. Sanduíches prontos, tirei o bolo. Muito baixo. Tinha que fazer outro. Mas a casa tava uma zona. Fui pra arrumação. Um jeito na sala e tudo o que era complicado pra dentro dos armários, inclusive as calcinhas do banheiro. Mudei uns móveis de lugar. Chegou o venezuelano. Já eram quase 4h. Botei o menino pra encher bexigas, ou melhor, globos, já que tento falar em espanhol com ele. Fui fazer o bolo. Chegou a menina de Fiji. Apresentei os dois e pedi em inglês pra ela ajudá-lo com the balloons. Dez minutos depois chegam os dois amigos brasileiros. Conversamos um pouquinho em português. Quando me virei pra apresentá-los, percebi a zona cultural e linguística que estava naquela casa. Muito bom.

Já eram 5h e eu não tinha terminado de assar o segundo bolo quando elas chegaram. Em compensação, a mesa estava linda, toda posta, com meu lençol todo colorido no lugar da toalha de mesa, que ainda está na lista de compras. Eu tinha mandado mensagens pedindo pra elas atrasarem, mas não dava pra enrolar mais. O bolo mesmo, decorado, com brigadeiro e morangos na cobertura e no recheio, só ficou pronto duas horas depois do combinado. Mas naquele momento já tinha desencanado de tudo, da hora e de me trocar. Dessa última parte me arrependi depois, quando vi as fotos do meu cabelo todo despenteado, a blusa amarrotada, meio fora de lugar, e o olho preto do resto da maquiagem do dia anterior.

A festa, por sua vez, foi ótima. A amiga taurina chegou trazendo as três virginianas. Conversamos, bebemos, comemos muito. As três cantaram parabéns e apagaram as 26 velinhas (1 grande pra uma, 1 grande pra outra e 24 velinhas de palito bem juntinhas pra terceira, já que essa foi comprada no próprio dia e era a única opção). O fogo acumulado das 24 velinhas foi maior do que o esperado e possivelmente teria disparado o alarme de incêndio, já a nossa casa tivesse um. As últimas a chegarem foram as primeiras a ir embora. Nas horas que se seguiram até o resto pegar o último trem, representantes de Brasil, Fiji e Venezuela se alternaram mostrando na internet suas músicas e danças típicas. A menina de Fiji dando um show à parte, seja na hula, no samba, axé, forró ou funk. Pra minha amiga que adora culturas diferentes, a festa não poderia ter terminado melhor.

Tuesday, September 16, 2008

Fim de uma era

Ela se foi. Depois de tantas vezes que fiquei com medo disso acontecer, ela se foi. Já não comia, não bebia água. O cérebro não funcionava mais, não dizia que ela precisava fazer esse tipo de coisa.

Não posso dizer que fiquei chocada. Quando o telefone tocou, já esperava a notícia. Quando vim pra cá já tinham me dito que provavelmente ela não ia conseguir me esperar. Mesmo assim, foi de repente que ela piorou.

Amanhã completo dois meses fora do Brasil. Há várias formas de ver isso. Eu prefiro pensar que ela se esforçou pra me esperar ir embora e só então poder descansar.

Sunday, September 14, 2008

As pedras e o mato deles

A primeira vez que ouvi falar de Pinacles foi quando ainda estava em homestay. A outra estudante que morava comigo ia fazer uma excursão pra lá no mesmo dia em que eu me mudava. Por isso, quando eu e minha amiga vimos que a nossa escola oferecia esse passeio - a um preço bem menor do que as agências comuns - logo nos animamos. Nem mesmo o trabalho atrapalhou, já que a princípio, nenhuma das duas trabalhava naquele sábado (no fim, ela acabou trabalhando, mas à noite, só). Em compensação, trabalhamos na sexta até as 2h da manhã. Quatro horas depois já estávamos (tentando nos manter) de pé pra pegar o ônibus.

Pinacles é um dos locais turísticos mais famosos da Western Australia. A imagem típica é uma foto alaranjada de uma rocha enorme no meio do deserto. Isso era tudo o que a gente sabia. O que a gente não sabia é que o lugar fica a 280 quilômetros da cidade, o que, com a velocidade reduzida do ônibus, fez a gente andar mais de quatro horas pra chegar no lugar. Grande parte do tempo passamos conversando com o nosso guia, um decendente de polonês que trabalha no setor de estudantes internacionais da escola e cuja idade eu não tenho idéia.

Ele aparenta não ter mais do que quinze, mas sei que tem mais. É loiro, baixinho, sem barba alguma mas já terminou a faculdade. A contar pelas milhares de dicas (escritas todas em post-its) que já nos, parece ser um exímio conhecedor das baladas e pubs de Perth. De tão simpático, talvez perca o emprego. Na hora de não efetivá-lo, o pessoal da escola reclamou que ele dá atenção demais aos estudantes e que deveria ser mais burocrático. Felizmente, ele não levou o conselho a sério.

No começo da viagem, ele só conhecia nós duas e o motorista. Na volta, era praticamente amigo de todos os alunos do ônibus. Um deles ele não só conheceu como nos apresentou. Era venezuelano. Está aqui há um ano e meio e ficou com os olhinhos brilhando quando minha amiga começou a puxar assunto em espanhol. Aparentemente, os resto dos latino-americanos não gostam tanto da Austrália como os brasileiros e por isso, ele largou os amigos indianos e passou o dia conosco, matando a saudade da lengua madre. Os dois falavam espanhol, o que eu até achei divertido, já que conseguia entender perfeitamente. Já na hora de responder, me confundi toda e alternava entre o inglês e uma tentativa de espanhol - "pra não quebrar o grupo" - misturada com português e italiano. A minha cabeça ficou numa zona tão grande que por vezes saía, dentro da mesma frase, uma palavra em cada língua.

Saímos às 8h. Meio-dia e tanto, depois de uma parada pro toilet, uma pra comer e alguns poucos minutos de sono, estávamos num parque pequeninho, de 5 km e cuja única atração - como bem definiu o motorista - eram pedras.

Um monte de pedras de formatos diferentes no meio do deserto, algumas de pouco mais de dois metros, outras ainda menores, o que me faz entender porque nenhuma das fotos tinha gente do lado. Se as pessoas soubessem o real tamanho dos Pinacles, ninguém perderia seu dia pra isso.

Já que não tinha muita graça ficar olhando, tiramos fotos. Um monte delas. Mais divertido do que tirar a foto era subir nas pedras. Com o tempo, foi-se criando quase que degraus nelas. Mais fácil que subir em árvores.

Passamos assim uma hora e meia. Depois, hora de enfrentar o caminho de volta. Quando a gente pensava que o programa de índio tinha acabado, voltamos à parada do toilet. Lá, nosso guia (que no começo da viagem me perguntou se eu sabia alguma coisa sobre o lugar pra onde estávamos indo, já que tinham perguntado e ele tava com vergonha de não saber) fez questão de nos mostrar as wild bushes, ou seja, a vegetação nativa da Austrália, o que, em trocando em miúdos, significa "mato". Pura e simplesmente mato.

A vegetação australiana, pelo menos a daquela região, é muito seca. As plantas não têm a cor viva do Brasil. São baixinhas, na sua maioria, têm folhas pequenas e por vezes fininhas, pra não perder água (se estivessem num jardim, minha mãe arrancaria todas). Uma coisa realmente interessante é que tem uma planta que precisa de fogo pra florescer. A semente fica dentro de um fruto seco e meio poroso. Pra liberá-la, os aborígenes (os índios deles) colocavam fogo perto da árvore - isso quando o fogo não acontecia naturalmente. Outra coisa diferente é que os mesmos aborígenes usavam a seiva de uma planta pra fazer uma cola mega poderosa. Mas isso os nossos índios também faziam.

Me senti meio idiota tirando foto daquilo tudo. Nunca que eu ia tirar foto do mato brasileiro, então por que tirar da versão aussie? Mas o moço é todo simpático, tinha resolvido incentivar. Isso até o momento em que ele foi mostrar o cocô de canguru, daí eu desencanei - o bicho mesmo a gente não viu, mas os vestígios dele estavam lá. E teve gente que ainda tirou foto.

De todas as plantas, só duas se destacavam pela beleza. As duas que não eram da Austrália. Foram trazidas pelos europeus e os passarinhos se encarregaram de espalhar. Nativo mesmo era tudo pequenininho, fragilzinho, feinho. Atração só pra turista.

Saturday, September 13, 2008

Impotência, again

Sei que tudo tem um começo e tudo tem um fim, mas não sei se um dia vou ser suficientemente madura pra aceitar. Ao mesmo tempo que queria estar com você, sei que não adiantaria muita coisa. A cabeça já não funciona direito. Há dois meses, o rabo mal abanava quando me via. Agora, parece que está na mesma ou pior. Cada vez mais no seu próprio mundinho e menos no nosso. É triste, no mínimo.

Estar aí, com você no meu colo seria quase que como um reconhecimento por todos esses quase 15 anos que a gente tem passado juntas. Quinze anos. Mais do que muitos casamentos. Uma vida inteira, literalmente.

Dizem que depois de um tempo só vemos as coisas boas nos outros. O rosto de um bom velhinho esconde tudo o que ele já fez de ruim na vida. Bem, quando jovem você foi tudo, menos bobinha. Nem parece que essa senhora de idade, com pêlo todo branco e que anda curvadinha, batendo a cabeça nas paredes, já caçou tantos bichos, já arranjou tantas brigas (com outros bichos, somente). Em todas as vezes, por mais que soubesse que seria punida, voltava com aquele ar de missão cumprida.

É a minha menina mais velha, primeira e mais forte de todas. Cada uma tinha seu jeito especial, personalidade mesmo, e todas vão ficar pra sempre no meu coração. Uma mais quietinha, a outra mais arteira, a quarta ainda uma criança. Você é a mais parecida comigo. Orgulhosa, por vezes arrogante, mas sempre amigável, feliz.

Muitas vezes fiquei com medo de que o goodbye fosse acontecer logo, mas a gente superou juntas. Calcificação da medula, câncer de mama, diabetes. Agora, essa espécie de Alzheimer. Doença horrível que degenera aos poucos, fazendo os pacientes perderem lentamente a contato com o mundo.

Tem gente que não entende como alguém pode se apegar tanto assim a um bicho. Bem, só o que posso dizer é que toda a dedicação valeu mais do que a pena. Toda criança precisa de um animal de estimação. Com eles a gente aprende a ter responsabilidade, a dar e receber carinho, a não acumular sentimentos ruins (ou esquece ou vai lá e resolve, mesmo que resolver signifique fazer xixi no meio da sala, só pra descontar). No fundo, crescemos as duas juntas.

Dizem que você nem sabe se estou ou não do seu lado. Sei que estão te tratando muito bem. Mas queria eu estar cuidando de você. Me sinto culpada por não ter feito mais. Faltou muita coisa. Você é a minha menina. Agora, já que eu não posso estar contigo, a única coisa que peço é que você fique bem.

Sunday, September 07, 2008

Ai que raiva

Alguns sentimentos são bons. Outros, ruins. Óbvio não? O problema é quando o sentimento trafega entre os dois extremos.

A raiva, por exemplo.

Sem pensar acho que todo mundo responderia que ela é um sentimento ruim.

Será?

Sentir raiva de algo pode ser um turning point na vida do ser humano. Depois dela, reagimos, mudamos, enfrentamos o que a causou. E isso é bom!

Poucas coisas me dão tanta raiva quanto perceber que algumas coisas só acontecem comigo.

Por exemplo, o que Carrie, do Sex and The City, chama de DD (Disastrous Date, ou algo parecido). É impressionante como tudo o que dá certo em qualquer casal do universo não funciona comigo. O amor mútuo, a vontade de experimentar as coisas juntos, o desejo de estar sempre por perto, o acordar ao lado... Se uma Jones atrai idiotas, e outra atrai pessoas esquisitas, eu nem consigo definir que diabo de pessoas eu atraio. E o relacionamento então? É qualquer coisa que passe longe de um namoro. E qualquer coisa que chegue perto do niilismo. Será que posso classificar a tranqueira emocional que vivo com o glamuroso DD da Carrie?

Outra coisa que me irrita profundamente são aquelas pessoas, que NEM são suas amigas, fazendo previsões sobre a sua vida com todo conhecimento de causa do mundo. Há mais ou menos meio ano ouvi de uma delas, do alto do seu conhecimento inexistente sobre mim e sobre o que eu estava vivendo, que eu tinha de sair fora do relacionamento (que ainda levo) porque eu era muita nova, não “merecia” passar por aquilo tudo.

Antes tivesse entrado por um ouvido e saído pelo outro.

Agora, acabei por experimentar um novo tipo de raiva, ainda mais forte. Quando duas situações que já me irritavam profundamente se encontram na vida. Chegar à conclusão que a guruzinha de meia-tigela estava certa sobre o não-relacionamento que estou levando é desolador.

Não, ele não me faz bem. Não, ele não tem sido legal comigo. Não, ele não quer nada sério.

Eis que surge a grande vantagem da raiva. A vontade de dizer chega! Não quero mais nenhuma das duas coisas. Não quero ninguém cuidando da minha vida. E ninguém se aproveitando da minha boa vontade emocional.

Ta vendo, a raiva pode ser boa. Mas que todo mundo quer se livrar dela rapidinho, disso eu não tenho dúvidas.

 

Tuesday, September 02, 2008

Coleguinhas

- Você fez o trabalho?
- Sim, eu fiz!!! Fiquei até as 5h da manhã fazendo, mas tá aqui! E você fez?
- Não... eu não sabia o que escrever. Ei, M***, você fez o trabalho?
- Não, não consegui. Minha melhor amiga sumiu.
- Sumiu, como assim sumiu?

Há menos de uma semana, esse menino, desempregado, do nada quase ficou na rua depois que o primo devolveu a casa onde eles viviam e foi pra Sidney. Tudo o que faltava era a melhor amiga do coitado desaparecer.

- É, sumiu... eu fui na biblioteca e ela não tava lá. E eu fui lá tendo certeza que era só que pedir ela ia me ajudar no meu trabalho de networking. Então, não fiz.

Ele falava isso dando risada. Terminou a frase e continuou sorrindo pra mim. Não só ele como todos na roda. Eu tentava entender. Alguns segundos depois, caiu a ficha.

- Ahhh, eu sou sua melhor amiga???

Como já disse, eu tinha dormido só duas horas, depois de passar a madrugada fazendo um trabalho monstruoso que deixei pro último dia. A lerdeza de pensamento tinha desculpa.

- hahaha é, eu não tava na biblioteca. Ontem fiquei fazendo o trabalho em casa.
- Se eu soubesse onde é tua casa, teria aparecido pra você me ajudar.

E pior é que não era difícil. Como disse uma amiga, tem algumas coisas que nunca mudam. Uma delas é que eu não durmo. A outra, que atraio gente estranha.

O cara em questão é um zambiano de 21 anos, mas que parece ter 18. Apesar de estarmos no mesmo grupo, sentados lado a lado, a gente só começou a conversar depois de quase uma semana. Ele é meio arisco no começo. Evita dizer que veio de Zâmbia, já que ninguém sabe onde fica e aparentemente australiana não morre de amores por negros e/ou africanos. Como eu vim do Brasil e sabia (vagamente) onde é Zâmbia, ele meio que abaixou a guarda. Do nada, passou a vir a todo instante pedir minha ajuda com os trabalhos, com o computador e até me chamou pra sair. Era tão dependente que quase o mandei à merda várias vezes. Xaveco? ? Não. Simples indolência.

Depois de duas semanas de aula ele me ligou desesperado porque o primo com quem ele morava foi viajar. Ele precisava entregar a casa e não tinha onde ficar. "Oi, Patty? Aqui é M***. Onde você está? Uma pergunta: o quão grande é sua casa?" - como a maioria do povo que vem morar aqui, ele antes de dar oi te faz um interrogatório, O "onde você está?" é sempre a primeira pergunta e vem antes até do "tudo bem?". É quase invasivo. As pessoas que vem pra cá ficam carentes, precisam de amigos e às vezes ultrapassam os limites do aceitável. Pelo menos do brasileiramente aceitável - Ele queria ficar em casa por um tempo, pelo menos o final de semana, e eu tinha acabado de mudar com a minha amiga.

Por mais que tenha ficado com pena do menino, não deixei ele dormir lá. Um porque não acreditava que ele sairia depois Dois porque naquele final de semana já tinha marcado de sair sexta e sábado. Não ia ficar me preocupando com alguém semi-estranho em casa. Nem eu nem minha amiga queríamos ninguém lá, mas não deu muito certo. Meia hora depois uma menina de Fiji da sala dela ligou. Como sempre, "onde você está?". As duas só tinham conversado uma vez na vida, mas ela queria sair. A irmã foi viajar, ela não pretendia ficar em casa nem dormir sozinha. Eu e minha ainda brincamos que poderíamos apresentar o meu amigo pra amiga dela. Os dois resolveriam seus problemas e quem sabe até arranjavam mais um. Mas isso ficou só nos planos, já que a cara de pau não foi tanta. Lógico, ela podia sair com a gente, mas não foi suficiente. A menina queria ir naquele momento pra nossa casa e ficar por lá. Insistiu muito pra isso. De novo, fiz o papel de chata e não deixei. A gente precisava descansar, fazer compras, lavar roupa...

Nos encontramos à noite. Ela saiu conosco, perdeu o ônibus e acabou dormindo em casa, mas ninguém achou ruim. Mesmo forçando a convivência, foi divertidíssima. Dançando a la EUA, quase esfregou a bunda nos caras da balada. Pagação de mico à parte, deu pra dar muita risada.

Entre os coleguinhas, uns são mais perdidos, outros menos. Eu tenho imã pros mais. E no fundo, gosto. Engraçados ou não, eles sempre são diferentes, têm algo de especial. Durante as aulas, além de M***, normalmente estou com duas mulheres. A primeira é uma indiana de 25 anos, casada, com filho. Ela fala baixinho, baixinho e pede ajuda pra tudo, já não entende muito bem inglês e muito menos de informática (no primeiro dia de aula eu tive que mostrar como se faz pra colocar underline em um endereço de e-mail). A outra é uma filipina de provavelmente 30 e tantos anos (ela se recusou a me dizer a idade certa). Depois ter fugido de homens a vida inteira "por medo de sofrer", ela veio há dois meses pra cá pra se casar com um australiano que só tinha visto uma ou outra vez. Em comparação com a outra, essa entende um pouco menos de inglês e um pouco mais de informática, visto que já sabia como colocar o underline. A diversão foi perceber que ele desaparece quando você sublinha a frase ou e-mail. "Olha, olha! Agora você vê... agora você não vê! Percebeu? De novo...".

Monday, August 18, 2008

À procura da casa perfeita

O trato desde o começo era "nós vamos morar juntas. De preferência, nós três, mas, mesmo que não dê certo, pelo menos nós duas vamos ter a nossa casa". Então, por mais que eu gostasse da minha homestay, do seu namorado (quase meu host cunhado) e de seu cachorro, no meio da minha segunda semana aqui comecei a procurar uma casa.

Achar sharehouses (repúblicas) é fácil. Uma caixa inteira, nem tanto. Na verdade, todo mundo dizia que era tão difícil, mas tão difícil que preferi pecar pelo excesso. Um dia depois de ter resolvido minha vida em relação ao curso (agora, depois ter pago o curso de Public Relations, ter tido que transferir no último minuto para Writen and Spoken English e ter feito um outro curso de inglês por engano durante dez dias, estou fazendo Management), ficamos - eu e minha amiga - procurando casas ou apartamentos, que são poucos, em prédios bem baixos, sem zelador, mas que, ao contrário do que eu pensava, existem aqui em Perth.

Começamos devagar, juntas no computador da biblioteca, com a lista de sites indicada pela moça da escola. Algumas coisas boas, perto do centro, mais ou menos o preço de uma homestay, mas um quarto só, pras duas. Anotamos os telefones, mandamos alguns e-mails.

Vagou o computador ao lado, começamos buscas separadas. Quando vi estava, como de costume, com mais de dez abas do internet explorer abertas, olhando descrição, preço e jogando no google maps pra ver se era ou não viável. Passamos a manhã e a tarde inteira assim. Por dois dias. Quinta e sexta. Na verdade, na própria sexta de manhã, fomos ver as primeiras casas.

Ao contrário do que acontece no Brasil, onde você procura um apartamento, liga pra imobiliária e ela faz quase todo o trabalho, aqui os imóveis estão listados na internet. Gostou? Ótimo! Espere até o dia da visita, porque ninguém vai te levar pra ver o apartamento só porque você quer. Eles têm dias pré-determinados para conhecer a casa e todos os interessados aparecem juntos, por quinze minutos. Se é isso mesmo o que você estava procurando, preenche o formulário e torce muito para que a agência escolha você em vez de qualquer um dos outros interessados. Uma brasileira que a gente conheceu no trem disse que demorou um mês até ser aceita em dos lugares. Daí fez sentido. Por que casa a gente viu que tem, a dificuldade então está em parecer confiável pra agência, o que, para duas garotas que haviam chegado há menos de duas semanas no país, não tinham emprego e muito menos referências, além das respectivas homestays, não ia lá ser muito fácil.

Bom... o normal agora seria contar essa história relatando os mil problemas que a gente encontrou, o número de vezes que fomos rejeitadas pelas agências e os inferninhos em que fomos parar. Mas, infelizmente pra história, felizmente pra mim e pra minha amiga, não teve nada disso. O único quase problema foi o contato com dois vigaristas. Um homem e uma mulher. Ambos colocaram mil anúncios desesperados nos sites de imóveis. Como a gente tava mandando e-mail pra todo mundo, mandamos pra eles também.

As histórias eram parecidas. Ele foi morar no Reino Unido com a família. Ela perdeu o marido e voltou com a filha pro Texas, nos Estados Unidos, onde deve se casar de novo em breve. Os dois estão com seus apartamentos mobiliados aqui, tentando desesperadamente alugar por um preço fantástico. Pra isso, eles te mandam as fotos. Você gosta, manda seus dados, eles preparam os documentos. Os dois assinam. Você faz um depósito sem nunca ter entrado no lugar. Eles mandam as chaves pelo correio. Simples, né? E tá cheio de espertinho desse jeito por aqui, pelo menos na internet. A gente ainda deu corda pro cara, falei por gtalk com ele, mas depois esqueci o assunto, ele também não insistiu.

Por baixo, devo ter mandado uns 30, 40 e-mails para donos e imobiliárias. Mas conhecer mesmo, só quatro casas, duas no sábado e duas no domingo. A primeira era num dos bairros mais queridos tanto por brasileiros quanto por australianos. Subiaco, lugar que dá nome a um estádio de football. O bairro é realmente uma graça. O apartamento, até hoje eu não sei. O lugar lembrava de longe um complexo habitacional, com um monte de casas geminadas, uma em cima da outra. Dois ou três andares, com escadas do lado de fora. Logo que chegamos, um dos nossos possíveis vizinhos, meio indonésio, olhava bem desconfiado. Em seguida, passamos por um velhinho totalmente trêbado. Por fim, o apartamento. Trancado e com uma porta tão suja quanto os outros. Fomos para o segundo do dia. Um estúdio, perto da escola, não tão perto do trem. Mobiliado, mas com só uma cama. Como móveis de segunda mão são baratos, a gente podia comprar outra. O problema era a total ausência de paredes. Nem a maior das amizades sobreviveria a isso. Então, fomos embora.

Se o sábado foi corrido, domingo deveria ser um pouco mais. Tínhamos decidido ver três casas. Uma às 10h30, outra às 13h30 e uma terceira às 16h. A primeira foi cortada de cara. Apartamento de um quarto pelo valor de dois. E sem mobília. Não valia a pena acordar cedo. A segunda casa era meio longe, mas tinha um preço bom, dois quartos e pertinho da estação. Por dentro, eu não tenho idéia de como é. Cheguei meia hora depois do combinado. Fui de trem. não sabia que precisava fazer baldeação, tive que voltar. Desci, fui pegar o trem certo e era o errado. Voltei mais uma vez. Minha amiga estava lá no horário certo, mas não conseguiu achar o endereço. Perguntou pra todo mundo, olhou no mapa e nada. Quando achou que ia ganhar uma informação relevante, recebeu foi um número de telefone, pro caso de um dia ela querer companhia pra sair. Quando finalmente achamos o lugar (por sinal muito perto da estação), só deu pra espiar pela janela. Nem sombra do pessoal da imobiliária. Na volta, conheci o tal cara do telefone, que refez o convite, dessa vez pras duas, de um dia jantarmos ou mesmo irmos a um pub.

A última casa era mais perto da cidade. A dona foi uma das primeiras a responder meu e-mail e inclusive mandou fotos. Casa de dois quartos, bonitinha, mas sem mobília nenhuma. Dessa vez, chegamos no horário, depois de almoçar cochinhas de frango frito dentro própria da estação. A dona veio com o marido e uma amiga. Mostrou a casa, que a gente já conhecia por fotos. Dois quartos bons, um banheiro meio feio, valor do aluguel dentro do aceitável. O único problema era a mobília. Era. Ela respondeu que tinha alguns móveis guardados e que poderia emprestá-los. Ia mandar um e-mail dizendo quais móveis eram esses e quanto iria aumentar no valor do aluguel por isso.

Segunda-feira, quatro dias depois de começarmos nossa busca, estávamos com todos os documentos assinados. Como o negócio foi feito direto com o proprietário, não precisou da tal burocracia de formulários. Bond pago, já tínhamos a nossa casa.

*Bond é uma exigência da lei australiana. Sempre que você aluga um imóvel tem que deixar o valor de quatro semanas em uma conta conjunta entre proprietário e inquilino. Ao fim do contrato, se nada estiver danificado, inquilino recebe todo o valor de volta. Se algo tiver que ser consertado, debita-se do bond. Só se pode tirar o dinheiro com a assinatura de todos os envolvidos no negócio.

Sunday, August 10, 2008

Impotência

Eu não deixo de viajar por conta disso, mas tenho que admitir que não sou a pessoa que mais adora aviões nesse mundo. Concordo que a chance de um avião cair é não sei quantas mil vezes menor do que eu bater um carro. Só que a batida de carro faz menos estrago.

Por tudo isso, pelo medo de pensar que vou ficar tanto tempo sem ver pessoas de que tanto gosto e até por rejeitar a idéia que talvez nunca mais veja alguma delas, demorou pra me emocionar por conta da viagem.

Tinha certeza que ia começar a chorar no arraial, quando estivesse reunida com todo mundo, amigos e família, pela última vez em quase dois anos. Mas acontece que a festa julina passou a ser só para alguns, meus pais não foram e eu queimei minha perna. Acontecimentos que anularam qualquer possibilidade de introspecção. Na verdade, acho que até parei de pensar nela com medo de que o médico vetasse os planos. A preocupação era só em ficar boa logo.

Mesmo aqui, o trauma não foi tão grande. Vim viajar com duas amigas, quase que irmãs, então aquela saudade absurda de carinho, de família, foi meio que suprida. Até nos piores dias aqui, aqueles em que tudo dá errado e a única coisa que você quer é um colo, a gente encontra paz só de ver um rosto querido e poder falar português. O meu problema, então, não é o presente, mas o futuro.

Ainda no Brasil, fui sentir o primeiro aperto mesmo quando me despedi da minha cachorra, bem velhinha já. Diabética, ceguinha e tomando um monte de remédios neurológicos, dá medo pensar no que pode acontecer em um ano e meio. Com o resto dos amigos, é simples. Por tudo isso é que fiquei tão chocada com o que aconteceu.

A mãe da minha amiga disse pra minha mãe que, pelo meu e-mail, parecia que eu estava com medo e acho que estava mesmo. Menos de um mês depois de eu ter queimado minha perna, meu irmão quebra duas vértebras do pescoço. Como o médico tem feito questão de relembrar, ele podia ter morrido, ter ficado paralítico, mas por sorte foi muito menos do que isso. Já fez uma operação, em breve fará a segunda, só pra ajeitar os pinos que seguram os pedaços de osso do quadril implantados na coluna.

Era de noite, ele estava no sítio, pulou na piscina, bateu a cabeça. Dormiu lá fora porque não conseguia andar. No dia seguinte, um pouco melhor, foi levado pro hospital e da lá, de ambulância, até São Paulo.

Não é à toa que fiquei assustada. Quando deixei o Brasil estava com medo de tudo o que poderia acontecer em um ano e meio. Meus pais, minha avó, minha cachorra, até mesmo eu, em meio àquela turbulência horrível entre São Paulo e Joanesburgo. Meu irmão, meus amigos, jovens, fortes, a gente nunca pensa.

Wednesday, July 30, 2008

São todos sacanas!?

Há séculos se discute o que torna os homens diferentes das mulheres. E o que fazer para diminuir essa diferença.
Nunca vi problema nisso. Pelo contrário. Graças a Deus que somos diferentes, porque se fossemos iguais, não haveria nada para ser complementado. A auto-suficiência soa tãããão chata.
O meu problema é outro, e esse eu nunca vi ninguém discutir. Porque até os homens mais bacanas são sacanas? Será que eles só são sacanas comigo, ou isso é do comportamento masculino?
Calma, antes de vocês começarem a listar um milhão de casos em que os meninos foram sacanas com as meninas, eu explico.
Não costumo me envolver com aquilo que muitas mulheres consideram o homem ideal: o cafajeste. Pelo contrário, gosto dos caras honestos e leais. Os que saem pra jogar bola, que viajam a trabalho, que vão pro bar com os amigos, mas nunca esquecem do respeito pela namorada. Nunca tive dúvidas com relação ao caráter deles.
Mesmo sendo honestos, atenciosos, carinhosos e bons caráteres, eles acabaram sendo sacanas comigo. No fim, eles acabam me magoando, me fazendo sofrer, me causando crises imensas, mesmo sem terem noção do que a atitude deles estava me causando.
Pra não prolongar muito texto, vou escolher só um exemplo.
E ele é inteligente, culto, interessante, carinhoso (quando quer), bonito, e tem aquela manha que derrete as mulheres (o tal Mr. Big de alguns textos atrás).
Por alguma razão inexplicável, acabamos nos envolvendo. Por razões mais do explicáveis, o nosso relacionamento estagnou. E chega uma hora que ou vai ou racha.
Decidimos (eu até estava me preparando pra isso, mas ele foi mais rápido) que o melhor era nos afastarmos – como um casal. Porque como amigos, nunca estivemos tão próximos. Eu, como sempre, concordei. Tenho esse problema sério, uma dificuldade absoluta de dizer não para as coisas que eles pedem. Não costumo dizer não para nada, mesmo que isso me incomode profundamente.
Mas o que distingue uma relação da outra?
Faço um esforço tremendo pra fingir que não sinto. Mas a verdade é que ele sabe que gosto dele, que tenho sentimentos. Quanto a ele, não posso dizer o mesmo. Aliás, o que posso dizer? Não tenho idéia.
Nunca mais fui à casa dele. Nunca mais fomos ao cinema. Nunca mais tivemos um jantar romântico. Por outro lado, continuamos nos vendo, nos falando quase que diariamente, trocando e-mails e mensagens, nos preocupando um com o outro. Quando por algum acaso estamos juntos, ele não hesita em me fazer um carinho, um cafuné, em me dar um beijo apertado (na bochecha).
Ele me provoca, e eu caio como uma patinha. Fico esperando a reação, a atitude. Fico esperando ele dizer que sente a minha falta, e que quer tentar de novo. Mas as palavras não vêm.
E tento superar isso, criar um milhão de pensamentos na minha cabeça que me afastem dele for good. Mas ele acaba com esse esforço imenso quando me dá um olhar carinhoso, um carinho mais intenso, um sorriso aberto, quando vem todo fofo me contar alguma coisa que aconteceu na sua vida.
Mas depois, o convite não vem, os carinhos não se prolongam, as situações não são discutidas. E a crise começa outra vez.
Talvez ele seja auto-suficiente de uma companheira e precise só de distrações temporárias. E nessa lista acho que sou a primeira. Nada de que eu me orgulhe.

Saturday, July 26, 2008

Estréia na balada

Era mesmo uma cena esquisita. Na hora que minha amiga chegou na porta do bar, eu estava com a câmera empunhada, tentando deixar a foto tão boa quanto a história. A modelo era minha outra amiga, que chegou junto comigo aqui na Austrália e que nesse momento, meio que contra a vontade, sustentava um periquito branco, uma cracatua, talvez, em cima da cabeça.

O bicho tentava se segurar no cabelo loiro enquanto ela, depois fui saber, só torcia pra que o passarinho não resolvesse transformá-la em seu banheiro particular.

A outra amiga, a morena, chegou, olhou aquilo, deu risada, mas desencanou de tentar entender. Ficou ali, parada no canto, conversando sobre qualquer outro assunto com as duas outras que vieram com ela, enquanto a ave era transportada pro meu ombro para mais uma foto; essa não tão legal.

O dono da passarinha (sim, ele garantiu que era fêmea e que era sua melhor amiga) era um cara quase gordo, meio sujo, loiro de cabelo enrolado e com seus 30 e muitos anos. Chegou ali, de repente, enquanto eu e minha amiga esperávamos o resto do grupo no local combinado, um dos vários bares do North Bridge, a Vila Olimpia - ou talvez Vila Madalena - da cidade.

A primeira frase eu entendi. "Ah... eu sei, vai, pode falar! Eu sei que você (ou vocês) tá louca pra passar a mão no meu passarinho". Eu olhei, dei aquele suspiro meio risada pensando que eu realmente só atraio louco. Minha amiga olhou pra mim com aquela mesma cara de surpresa. E o cara continuou. Falou por uns 2, 3 minutos. Só parava de vez em quando, esperando uma reação, que não acontecia, já que a gente estava parada, só olhando e esperando o fim da história ou alguma frase compreensível, mas ele deve ter achado que eu tava simplesmente concordando. Por fim, ele pediu uma manifestação sobre tudo aquilo. Eu fiz aquela cara de "é, não rolou" e emendei com um "sorry, we didn't get it".

Em vez do cara ficar puto, ele abriu um sorriso daqueles de orelha a orelha e perguntou da onde a gente era. Brasileiras??? E fez algum outro comentário que a gente também não entendeu. Se ele não tivesse dançando praticamente, trocando o pé de apoio a cada dois segundos e cambaleando pra frente e pra trás, poderia ter ficado meio preocupado, mas ele foi o primeiro com quem não consegui conversar, então tá tudo ok. E já que papos normais não deram muito certo, ele começou a puxar assunto sobre a passarinha dele, cujo nome, se não me engano é Eagle. Se não for isso, é o mesmo nome de uma águia famosa. De toda forma, um tanto quanto paradoxo prum passarinho de menos de 20 centímetros de altura e que não machuca ninguém, mesmo sendo muito corajosa. Essas duas últimas afirmações, lógico, foram o dono que fez, eu só repito.

E pra mostrar que ela era boazinha, ele pediu pra minha amiga estender a mão. Ela, com medo, hesitou umas três vezes, então, ele, delicamente, agarrou o bicho e quase o amassou no ombro dela. Eu adorei a cena e peguei o celular pra tirar a foto. Ela me deu sua câmera e o cara, que gostou ainda mais da idéia, resolveu trocar o lugar da ave, pra dar uma foto mais legal. Foi nessa hora que minha amiga chegou. Conversamos mais um pouco com o cara e fomos embora. Ele chamou a gente pra ir prum bar e, depois de ter ficado meio bravo com a recusa, minha amiga disse que ele deveria dormir um pouco. "É, quem sabe amanhã", e foi beber mais um pouco. Dizem os boatos que Perth é cheio de loucos. Não sei se é verdade, mas esse foi meu primeiro.

Todas reunidas, fomos caçar um lugar pra ir. Nas redondezas, um monte de pubs. Em todos você entra de graça, mas ontem tava muito frio, chovendo e por isso ninguém sai. Uma professora disse que Perth é guiado pelo tempo. No frio, nada acontece, no verão, isso ferve. Não sei quanto a segunda parte, mas sobre o frio ela estava certa. Dez horas, passamos em três bares e os três vazios. Acabamos ficando em um com um ótimo aquecedor. A bebida da Austrália é o Lemon Limon Bittar. Algo tão alcóolico que você pode tomar uns 10 e continuar de pé, mas é bom. Tomei um só. Começou a banda, mas mesmo antes disso uma loira de vestido vermelho e um mega salto já tinha caído duas vezes no meio do salão e em todas as ocasiões foi acudida pelo moço que tava com ela. Segundo as meninas, esse é o normal. Australianas saem de micro vestido mesmo no frio. Bebem demais e nem sentem. Saem carregadas, tiram a roupa no meio da rua... mas tudo isso é só fofoca. Eu só vi a parte do beber demais mesmo.

Esperávamos dar umas dez horas pra gente trocar de bar. Em uma das músicas, eu e uma das meninas lembrávamos dos nossos tempos de show de rock todo mês, pelo menos. Ela na grade e eu lá no fundo, com os meninos, como sempre, no meio das rodinhas. Achei muita coincidência quando, uma meia hora depois desse assunto, a amiga loira (mais fácil diferenciar assim) me puxou pra longe da confusão. Só consegui ver um cara abaixado e correndo dando socos. Pensei... "nossa... rodinha aqui? E, depois de estar muito perto da mão fechada dele, saí de perto porque não tava mais na idade dessas coisas. Foi então, pela cara das pessoas, que entendi que era briga de verdade. Quer dizer, mais ou menos de verdade, né... porque com um soco daquele acho que não se consegue machucar ninguém. Seguranças, ele vai embora, se solta, volta pra tentar bater mais... aquela coisa de sempre. Mas foi a nossa desculpa pra dizer que tava na hora de mudar de bar.

O outro era um pub maior, também com música ao vivo. Na entrada, além deles checarem seu passaporte ou ID, carimbam um "ID checked" na seu pulso. Dizem que esse é o lugar onde vão os australianos mais sem noção, lesados mesmo. o que foi justificado pela criatura esquisita, loira e bêbada que veio dançar na nossa roda mas que foi logo dispensado.

Outra coisa bem diferente é o tamanho do decote da maioria das meninas; às vezes tão grande que o peito pula. Como resultado, freqüentemente elas tinham que arrumá-lo de volta no sutiã. Segundo minha amiga, a preocupação tão grande com a comissão de frente é pra compensar a falta de bunda. Não vou comentar... falar mal de mulher parece despeito.

Já de briga, o máximo foi um cara sendo carregado por um segurança e com mais dois acompanhando - o que foi um pouco de exagero, já que meio segurança já seria suficiente pra conter o pequeno encrenqueiro.

Se teve mais coisa, não sei. Em algumas das mil televisões do pub passava rugby. Em outras o tal footeball e numa única solitária, tênis. Amanhã faz um mês que não jogo. Terminou minha temporada com a final do campeonato paulista. Única partida em que acho que joguei bem. Olhava fascinada pras telinhas, mesmo sem entender o porquê de não existir rucks - o jogador caía, matava a bola no chão, o jogo recomeçava com uma saída simples. Mesmo scrum era difícil de se ver.

Voltamos pra casa um pouco antes da uma - penúltimo trem de final de semana. Nos vagões, um monte de australianas com micro vestidos e pernas de fora, extremamente bêbadas. Mais uma lenda que parece ser verdadeira.

Thursday, July 24, 2008

Os trens e o francês

Nos meus últimos meses no Brasil, minha mãe disse umas três vezes "que tristeza que é pegar ônibus de domingo", toda vez que via alguém no ponto de final de semana. E eis que no meu segundo dia em Perth, domingo, primeiro dia em que acordei aqui, eu peguei um trem, um ônibus, conheci minha escola, peguei o mesmo caminho de volta e depois de 15 minutos peguei mais dois trens pra ir e dois pra voltar da cidade vizinha onde um dos meus amigos está morando (isso sem contar as caminhadas). No final do dia, já me consideravam especialista nas timetables.

Há três tipos de trem em Perth. Pelo menos, três que peguei até agora, mas no folhetinho diz que tem muito mais. Um serve a todas as estações. Os outros dois só a algumas. A diferença está na letrinha que vem junto com o destino, mais ou menos com os Lapa T e Lapa H; República 5121 e República 5154 de São Paulo. Aqui, devo fugir fugir só do Arminale C, que não pára em Queenspark.

A técnica para pagar e simples e fácil de ser burlada, mas acho que ninguém pensa nisso, então eu também procuro não pensar. Ou você usa um cartão, meio a la bilhete único, ou compra tickets na hora, numa maquininha. O problema é que nem todas aceitam notas. Se você não tiver moeda ou o cartão de ônibus, não sei o que faz. Provavelmente entra sem pagar e só torce para que entre nessa estação que separa você da próxima maquininha não haja nenhum fiscal nos vagões (nem no ônibus nem no trem há qualquer tipo de catraca, no máximo um um cara controlando a entrada nas estações maiores).

Se a confiança é grande, a multa para quem a quebra é maior ainda. São cinquenta dólares australianos só para quem compra passe com desconto sem ter a carteirinha. Pra quem não tem bilhete, não tenho idéia de quanto seja.

No domingo, depois de ter conhecido minha escola com minha host mother (ou host big sister, como ela mais se parece), encontrei com minha amiga também recém-chegada e seu companheiro francês de homestay. No meio da viagem, vi o tal guardinha, cuja existência até então eu ignorava. Como eu e minha amiga tínhamos pagado passagem normal, não havia problema. Já o menino comprou de estudante e não levava a carteirinha - ou qualquer outro documento -, só, por sorte, vestia o blusão da universidade onde ele estudava inglês. O guarda entendeu, explicou que da próxima ele deveria comprar passe normal e foi embora. No fim, o inglês ruim do francês ajudou a embasar a tese de que ele não sabia o que tava fazendo.

A nossa intenção era chegar cedo pra ver o tal market de Fremantle, mas a gente chegou, demorou dois séculos até achar meu amigo num bar de comida asiática, conversamos um pouco, depois fomos comer no Hungry Jack - versão australiana pro Burger King. Um cara explicou que há alguma coisa, talvez alguma lei, que não permite o uso de nomes da monarquia em estabelecimentos comerciais. Eu relacionei direto com a monarquia britânica, a quem a Austrália responde, e desisti de descobrir se essa é a explicação verdadeira.

Depois de matar a gigantesca fome ao lado de um monte de adolescentes EMOtivos (eu juro que nunca vi na minha vida uma quantidade tão grande de crianças com cabelos lambidos e esquisitos, tachinhas, piercings, roupas pretas e acessórios coloridos juntas em um lugar supostamente neutro), uma família e um cara gordo, fomos encontrar o tal pub. Mas eu acho que tava tão feliz de ter comido que esqueci de prestar atenção no caminho. Como os outros dois conseguem ser tão ou mais desligados que eu, só percebemos que tínhamos andado demais depois de uns 15 minutos de caminhada. Dai a gente foi pra cima e pra baixo da rua algumas vezes, até que lembrei do final da explicação. Não era só virar às esquerda, também precisava virar de novo à esquerda no farol seguinte. Juntamos isso com algumas indicações coletadas na rua, chegamos até o tal bar.

A festa era de Satã, não aquele vermelho, de cifrinho, mas um amigo do meu amigo, vindo da Arábia Saudita e que realmente tem esse nome. O moço acabou de se formar na escola e vai fazer uma faculdade na Austrália. Por isso, tava dando uma festa numa área reservada no lugar onde ele trabalha, um pub todo bonitinho com música ao vivo.

A gente chegou, passou pelo cara que tava fazendo som com voz e violão, entrou na área reservada. Lá dentro, meu amigo sambava com uma amiga. Comecei a dar risada. O dono da festa, cuja brancura já tinha sido descrita, me olhava com uma cara de quem é você? Não tive tempo de me apresentar.

Atrás de mim começava uma discussão entre o bartender e o amigo francês, que acabou de fazer 18 anos, é branquinho, sem barba, cheio de espinha na cara e que, assim como minha amiga, esqueceu o passaporte. Mas o bartender não quis saber dela ou de mim. No fim, já que a gente não ia ficar de qualquer jeito, ficamos um pouco frustradas por as pessoas nem cogitarem que a gente pudesse ser menor de idade. Acho que a gente tá mesmo ficando velha.

Por mais que tentássemos conversar, não teve jeito e fomos os três embora. Já na saída, fui apresentada rapidinho ao dono da festa e conversei na rua com meu amigo, que ficava entrando e saindo de trás de uma linha branca pintada na calçada e que delimitava a área do bar, já que tem uma lei na Austrália (sim, a Austrália é cheia de leis) que não permite que se beba nas ruas.

O menino bem que sugeriu dele ir embora sozinho, mas se a gente veio junto, a gente vai embora junto. E na volta, nova confusão.

Australiano é um povo bem simpático, agradável, mas diz a lenda que eles bebem muito. Nesse dia, descobri que não é lenda, principalmente quando tem jogo do futebol esquisito deles, um mix do nosso futebol com rugby e que eu achei chatíssimo, mas que o namorado da minha homestay, e aparentemente o país inteiro, adora.

A gente pegou o trem e sentou os três juntos. Um cara que estava ao lado do francês resolveu puxar assunto e perguntou, se matando de dar risada, o que ele fez no domingo. Ele, inocentemente, contou seu dia, começando pelo homework. O outro então começou a fazer gracinhas e piadinhas a respeito do menino novinho com duas garotas visivelmente mais velhas. Mudamos de lugar e, ao chegar na estação central, cada um tomou seu caminho.

Eu, que já me achava a mais entendida sobre os trens de Perth, perdi três saídas e o tempo de escrever esse texto inteiro (o que deve ter dado mais ou menos uma hora) pra perceber que nenhum ou quase nenhum trem que vai pra Armindale passa na minha estação e que o T que tanto aparece é de Thornile, destino alternativo da mesma linha, que sai de outra plataforma e que era a minha única opção pra chegar em casa.

Tuesday, July 22, 2008

Primeiro dia na escola, mas nao de aula

No primeiro dia todo mundo chega atrasado. E na minha folhinha, não tinha nem ao menos o horário de início das aulas. Dizia somente pra eu ir até o centro de estudos internacionais. E isso no dia 12 - sábado - e hoje era dia 21, segunda. Portanto, o compromisso com o horário, que já era pequeno, se tornou nulo.

Eram sete e vinte quando eu finalmente resolvi levantar. Hoje, acordei às 6h, ainda vítima do fuso horário.

Logo no primeiro dia, depois de muito passar frio, resolvi dormir. Não sei que horas eram, mas possivelmente umas 9h da noite, quando ainda tava assistindo tv com minha homestay e o namorado. Algumas horas depois, acordei no meio da noite com uma vontade imensa de fazer xixi. Então, não consegui mais dormir. Ouvi um passarinho cantando, aqui, atrás da minha janela. Em seguida, um avião passando. Depois de mais uns passarinhos, ouvi o apito do trem. Por fim, começou a clarear e eu perdi o sono de vez. À noite, antes das 22h, eu já tava podre. Daí, pra parar com isso, hoje fiquei enrolando até demais. Na hora de sair, minha homestay disse que tava atrasada. Eu disse que não sabia se estava hoje, mas que eu tô sempre atrasada. Ela ficou toda feliz. "Oh, so you are just like me!!!" e saiu correndo.

Já na escola, fui levada até uma sala onde tava terminando a apresentação do curso. Depois, prova: redação e entrevista. A entrevistadora adorou meu livro, como ela mesma chamou. E isso que eu nem escrevi tanto. Já na hora da entrevista, algumas engasgadas e, por isso, não sei em que nível estou. Conversamos por cerca de cinco minutos, uma falando mais rápido do que a outra. Ela pra me testar, ver até que ponto ia o meu entendimento, e eu porque é o normal mesmo.

Depois do coffee break com uns muffins de chocolate muito bons (o povo daqui adora muffins e eu adoro os muffins deles), fomos fazer um pequeno tour pelo campus. Fui liberada pouco depois do meio-dia e tinha combinado de me encontrar com minha amiga só às 5h da tarde. O celular dela tava sem bateria e a tomada do carregador não serve pra cá, então não tinha nem como desistir.

Como minha casa fica a uns 10 minutos de caminhada do trem e o trem demora mais uns 15 minutos em média pra passar, resolvi enrolar pela cidade. Logo que saí da estação fui até o centro de informações pra turista e perguntei sobre algum café com acesso a internet. O cara me indicou um lugar, mostrou no mapinha, me deu esse mapinha, mas eu me perdi do mesmo jeito.

O centro de Perth é muito cheio e muito movimentado. Parece mesmo o centro de são Paulo, só é menor. E daí, como tava perdida, passei a perguntar por qualquer internet cafe. De indicação em indicação, rodei mais de duas horas com a mala do note no ombro. Meu pé tava doendo, eu já tava xingando todo asiático que via pela rua (só na minha escola tem milhões deles, ou adolescentes com aquele monte de tranqueira tecnológica ou caras mais velhos querendo cidadania, tipo um cozinheiro malasiano que eu conheci), toda lan house pra que me mandavam e todo restaurante chinês ou coreano ou tailandês que tem a cada esquina em um dos bairros daqui. Até que resolvi entrar em outro centro de informações para turistas. No andar debaixo, não tinha ninguém. Subi e lá a japinha (essa do Japão mesmo, que eu perguntei) disse que toooodo o centro da cidade tem internet grátis. Ela mesma tava usando internet banda larga, mas não pagava por ela.

Eu fiquei indignada de ter rodado tanto à toa, contei a história pra menina, simpaticissima, por sinal, peguei uma cadeira e testei na hora, pra ter certeza. Entrou!!! Mas daí precisava fazer um cadastro rápido, eu desisti. Preferi voltar até o shopping e comer alguma coisa em qualquer café, já que todos eram internet cafe e nem sabiam disso. Voltei, achei um café bonitinho, paguei 17 dólares por um sanduíche no croissant, um muffin e um chocolate quente, mas tava feliz. Tentei acessar e não entrou. Depois de três tentativas, todas frustradas, apareceu o aviso de falta de bateria. Fiquei puta, desliguei o bicho, coloquei na mala e comecei a pensar o que faria nas duas ou três horas que faltavam pra encontrar minha amiga.

Eu não aguentava mais andar, e enquanto pensava em demorar o máximo possível pra terminar a metade do chocolate quente e do muffin que faltavam, vi a mochila cor de rosa dela entrando no shopping, ali bem na minha frente. Eu pensei em gritar, mas ela tava muito longe e eu dentro do café. Então, virei a metade do copo que faltava de uma vez só, agarrei o resto do doce e saí correndo, esbarrando nas pessoas e derrubando meu guardanapo. Consegui encontrar com ela, que não teve aula hoje e estava rodando desde as 9h da manhã. Já tinha conhecido todas as lojas do shopping, ido até Fremantle de trem e voltado e por fim estava em dúvida se pegava o trem de novo ou se comprava um livro.

Durante as duas que tivemos antes das lojas fecharem (ou seja, se a gente se encontrasse às 17h não íamos conseguir fazer nada), a gente passou na farmácia duas vezes, uma pra cada uma, comprou um adaptador e um transformador de energia pra ela; comparamos os celulares e por fim compramos um, igualzinho, já que é o único que pega Skype.

Enquanto a gente conversava e fazia graça com a câmera do celular, descansando na pracinha, chegou uma menina perguntando se a gente tava procurando emprego. Eu dei risada e disse que ouvi que era fácil encontrar emprego em Perth, mas que nunca pensei que alguém fosse me abordar perguntando se eu tava procurando. Mas o emprego não era tão legal. A princípio, achei que fosse. Ela trabalha pruma agência ligada ao Greenpeace, mas você tem que parar as pessoas no shopping e pedir dinheiro. Se você consegue, ganha uma comissão. Além do fato de eu detestar arrecadar dinheiro, se estivesse doando pra uma instituição, não ia querer que a pessoa que veio me procurar ficasse com uma parte do que estou doando, então desanimei antes mesmo de saber que meu horário de escola impossibilitava a brincadeira.

Conversei mais um pouco com minha amiga e voltei pra casa. Combinamos de nos encontrar na quarta-feira só. Ela só tem dois dias de aula e amanhã é o mais pesado dele. Já eu estou louca pra entrar na internet e habilitar meu brinquedo novo, daí falo de graça a qualquer momento com todo mundo, já que eu percebi que internet sem fio banda larga é um pouco mais complicado.