Thursday, June 18, 2009

Odisséia em duas rodas

A primeira idéia ao chegar em Townsville era comprar um carro ou uma moto. Não vou mais reclamar do sistema de transporte público daqui, mas preciso enfatizar que arranjar um emprego de madrugada sem 'own transportation' era praticamente impossível. Mas daí, fui morar perto da cidade, tudo ficou lindo. Se a pé eu demorava 25 minutos, de bicicleta não ia demorar muito mais do que dez.

Daí, chegou a hora de comprar a bike. 90% dos estudantes acabam comprando bicicleta de segunda mão, o que é uma atividade altamente sustentável: tem benefícios econômicos porque se paga bem menos; ecologicamente correta porque diminui a produção de bens e a geração de lixo e social porque ajuda as pessoas a se conhecerem. Mas é lógico que ninguém pensa nisso e simplesmente compra de second hand porque é mais barato.

Um dos meus amigos chegou a me oferecer a bike dele, com alguns problemas, mas que daria conta, afinal, eu só queria pra ir até a city. Não ia querer ir até a facul pedalando, ia? Até aquele momento eu não ia, mas quando ele me fez essa pergunta, um bichinho me mordeu e eu pensei "ah, mas por que não?". Daí f***.

Só pra variar um pouco, a história com a bicicleta também tem sido intensa. Em quatro meses andei em mais bicicletas do que em toda minha vida. Mas também, que graça teria comprar uma bicicleta nova, chegando em Townsville, andar com ela pra cima e pra baixo sem nada de diferente pra contar? Lógico que não precisa ser tanto, o texto fica longo, Lana reclama, mas mesmo assim.

Como eu nunca fui lá muito amiga das duas rodas, preferi não arriscar e pegar uma bike melhorzinha - o que por sinal foi muito sábio, já que um mês depois a roda que estava solta quase caiu com meu amigo andando.

A primeira bike que comprei, por 30 dólares, incluía capacete e uma corrente amarela que servia de decoração, já que não tinha chave e não dava pra abrir. Mesmo depois de trocar a borrachinha de lado, o freio não funcionava e tinha alguma coisa de errada com a correia, já que ela fazia altos barulhos quando pedalava. Apesar de tudo, ela me foi muito útil - durante quase um mês.

Logo que peguei a bike, quase morri de cansaço. Estava voltando pra faculdade pedalando com a amiga alemã, que encontrei na volta da casa da moça, mas o sol, o peso da mochila, o tênis e a bermuda apertada me fizeram me jogar na grama antes de passar o portão. Naquele dia, precisei tomar algumas cervejas na faculdade e uma casquinha do Mac no meio do caminho pra conseguir chegar em casa, já de noite.

No final de duas semanas, em vez de simplesmente de diminuir o tempo em que eu gastava pra chegar nos lugares, eu aumentei meu raio de atuação, e desde então conseguia andar por Townsville inteira mesmo com as restrições de ônibus. Em resumo: voltei a abraçar o mundo.

No último dia em que vi a bike prateada, fui até o shopping perto da faculdade, deixei-a acorrentada e voltei pra casa. O casal de brasileiros foi me pegar, fomos prum churrasco num bairro afastado. A idéia era sair de lá às 3h, pegar uma carona até a cidade, de lá pegar um ônibus até o tal shopping e ir de bike até o estádio de rugby, mega longe de tudo, onde ia trabalhar.

Mas aquele dia era feriado na Austrália, o chamado Anzac Day, em homenagem aos mortos em guerra, o que significa que os únicos ônibus pro estádio seriam fretados e em horário especial, muito mais tarde do que eu precisava. O plano complexo que arranjei era a minha melhor e talvez única opção. Mas, por sorte, ou azar, ganhei uma carona até perto do estádio. No fim do jogo, peguei outra carona direto pra cidade e só fui pegar minha bike no dia seguinte. A senhora com quem vivia me levou até o shopping com medo de que a bichinha não estivesse lá. Eu desci do carro, disse que estava tudo bem, ela foi embora pra em seguida eu perceber que a bicicleta parecia maior do que eu lembrava, o capacete era de outra cor e o cadeado era diferente. É, não era a minha bike, só a cor era igual, e eu acabei voltando de ônibus.

(Em Townsville, os únicos roubos que acontecem são de bicicleta. Em Perth ainda se roubava GPS, mas parece que aqui nem isso. Segundo o professor australino de um amigo, quem rouba é ou pra comprar droga ou porque não tá a fim de andar e resolve pegar a primeira bike que vê pela frente, que vai ser largada alguns quilômetros adiante. O meu cadeado, de numerozinho, é um dos mais fáceis de arrombar, mas como tenho certeza que se tivesse chave ia perder, fazer o quê?)

No começo, achei que o roubo da bike era coisa de inferno astral. Com tanta bike boa, nunca que achava que alguém ia querer a minha, mas em feriado em Townsville, talvez ela fosse a única disponível. Isso aliás, serve de esperança pra muita gente desiludida, achando que nunca vai encontrar o homem dos sonhos, o emprego perfeito... dependendo da situação, o inesperado, sim, acontece.

Já eu fiquei a pé de novo e só de despeito, como bem disse minha tia, mal perdi uma, comprei outra. Essa, bem boa, verde e roxa, com o freio funcionando perfeitamente, mas se duvidar ainda menor que a antiga. Só que como eu fui andando até a casa da mulher, a 7km da faculdade, nem cogitei desistir e voltar andando ou de ônibus.

Tava quase acostumando com o tamanho dela, quando o pneu estourou enquanto ia comprar um bolo - no episódio épico do meu aniversário, onde tudo parece que resolveu dar errado. Voltei do mercado na bike de um amigo e ele com a minha nas costas.

No dia seguinte, peguei a bike do brasileiro casado só pra ir pra faculdade, mas ela tava tão ruim que a correia quebrou, a roda girava em falso, tipo bicicleta ergométrica (o que me fez demorar duas horas pra fazer um percurso de 40 minutos), e o pedal caiu. Tudo no mesmo dia.

Outro detalhe é que os freios aqui são ao contrário do que no Brasil. O direito é o da frente e o esquerdo o de trás. Não que eu soubesse dessa diferença até vir pra cá, mas o tombo da minha roommate acabou me ensinando. Depois de eu tentar remendar o pneu com kit de borracheiro e tudo - mas acabar comprando outra câmara porque o furo era maior do que patch kit suportava - foi a vez dessa minha amiga levar um susto com a bike.

Ela, usando minha possante, viu um carro e freou. Na sua ex-bike, que foi roubada (mas sem estar acorrentada) na porta de casa, o freio não funcionava. Então ela apertou ao máximo - o da direita, já que segurava o celular na esquerda. A bike parou, mas foi tão rápido que a roda de trás levantou, bicicleta e ciclista viraram de ponta-cabeça. Graças ao capacete, que aqui é realmente obrigatório, nada de mais sério aconteceu no rosto. Já joelhos e mãos, principalmente, ficaram bem ruins. No dia seguinte, ao ver o câmbio destruído, banco entortado e luzinha quebrada só ficava com mais pena do que aconteceu.

Já eu, devo dizer que até semana passada, por mais incrível que pareça, ainda estava ilesa! Mas eis que depois de um ano sem me machucar, foram três vezes na mesma semana - o que é bom, já que significa que minha perna tá tão boa que já voltei a fazer as mesmas asneiras de sempre.

Da primeira vez que me machuquei, saí correndo de casa pra ir pra prova. Esqueci de colocar o shorts debaixo da saia mas tava atrasada demais pra voltar. Quando cheguei, a tempo, tinha muita gente no estacionamento de bicicletas. Deitei a bicicleta pra tentar levantar a perna o menos possível. Não deu certo, desequilibrei, caíram a bike e eu, por cima dela, no chão. Ralei o joelho, estanquei o sangue com papel higiênico e fiz a prova. Se o povo viu o tombo? Não tenho a menor idéia. Mas como o machucado foi pequenininho, fiz um upgrade nele no domingo, quando, durante uma partida inétida de vôlei de praia (é, aqui tá quente) ralei o mesmo lugar de novo - o bom de areia é que estanca o sangue rápido.

Por fim, há dois dias, quando falava no celular, andava de bicicleta e descia uma ponte em declibe e curva, tudo ao mesmo tempo, caí de novo. Tinha tentado frear com o esquerdo e não deu. Acabei freando com a direita como última chance de não me estourar na parede. Na hora em que a roda de trás levantava eu só pensei "ah, de novo não". Joguei a bike e caí no chão. Dessa vez, machuquei bonito o joelho (o mesmo, lógico) e fiz um calombo roxo enorme na perna. Levantei, passou a dor, cheguei onde precisava, voltei pra casa. Pedalando, lógico.

2 comments:

Cristiane Tatian said...

Oi Bruu
Aqui eh a cris, sharemate da "tua" Cris:
caralhoooo...eu ri mto com o teu texto...mto bom
tu eh corajosa de ainda subir numa bike depois de tudo isso..hehhehe
Bjusss

Laís said...

Essa é a Patti Marie que eu conheço...hahahahaha