Friday, February 15, 2008

Pau-a-pique e pé-de-barro

O carnaval já passou, mas as lembranças ficam. Fui acampar no interior mineiro. Ok, eu sei. Acampar no meio do mato, sem energia elétrica... Tudo isso soa meio estranho pra quem me conhece. Mas devia isso para uma pessoa muito querida e, apesar choque cultural, sobraram histórias pra contar. E a cachoeira era maravilhosa. Então valeu à pena!
A balada era uma casa de pau-a-pique no meio do nada. Pra chegar lá, do camping onde estávamos, precisava pegar uma estrada de terra mal iluminada (nos trechos em que havia alguma iluminação).
Pra completar o clima roots, ela estava infestada de hippies e nativos, e tocava forró.
A primeira vez me causou tantos traumas que, no caminho de volta, pela tal estradinha de terra com mais duas meninas, prometi pra mim mesma que não voltaria lá.
Mas como não podemos botar a mão no fogo por nada que prometemos no carnaval, acabei voltando. Dois dias mais tarde em um Gol quadradinho com mais oito pessoas!!!
Fui convencida pelos primos da minha amiga que haviam recém chegado. Imaginei que, em uma turma grande, acabaria me distraindo.
Pasmem! Havia uma cantora de MPB, parece que sobrinha da dona do local, com uma bela voz. Dei o braço a torcer, dancei e me diverti. Mas desanimei quando acabou o show e ela anunciou que em breve a banda de forró tomaria seu lugar.
Pois mal havia sentado e a namorada de um dos primos veio me chamar, porque um amigo seu queria me conhecer. Na hora não sei se fiquei mais pasma de pensar que alguém realmente acreditava que eu me levantaria de lá pra ir até ele, e não o contrário, ou se era porque fiquei imaginando quem ainda se prestava ao serviço de pedir pra alguém “agitar uma mina”.
Não levantei. Algumas músicas mais tarde ele apareceu. Um cidadão grande, de uns 30 e poucos anos e da largura de um armário. Tava meio grandinho pra pedir pra agitarem qualquer coisa, né? Pois bem. Estava sentada ao lado de uma caixa de som e ele queria que fosse conversar com ele do lado de fora da casinha.
Apesar de ter dito que não levantaria, ele insistiu dizendo que eu não o ouviria bem. Cansei! “Com todo respeito, não levanto daqui nem pra dançar com meus amigos, não vejo porque levantaria pra conversar com você. Se quiser, converso aqui, estou te ouvindo bem”. Ele se irritou, porque depois que falei isso, levantou e acompanhado de um gesto agressivo com os braços gritou que eu ficasse lá então. Hehe, mas não era exatamente isso que eu queria? Na hora pensei que o cara fosse me bater e que de longe esse seria o episódio mais bizarro da noite. Ledo engano!
Já no fim da balado um cidadão nativo (nascido naquele fim de mundo, onde as pessoas ainda devem se assustar com antena parabólica), trinta e poucos anos, cabelos enroladinhos e regatiiiinha, começou a me olhar. Percebi e, como sempre, ignorei!
Pouco tempo depois, seu amigo que era uma espécie de César Cielo depois da febre amarela, e que olhava pra mulheres da maneira mais nojenta que já vi na vida, de longe começou a fazer gestos com os dedos indicadores de que eu e seu amigo deveríamos ficar juntos. Na hora fiz que não, assim nem teria o trabalho de dispensá-lo. Que nada, o cara veio me tirar pra dançar forró. Agradeci mas disse que não dançava. Só que ele insistiu.
“ Hoje é seu dia de sorte, porque eu sou professor de forró”. O pior, falava isso com orgulho. Como não tinha/tenho interesse em aprender, disse que não queria. E ele já profetizou o que seria minha noite. “Não acha que desisti. Daqui a pouco volto”.
Pois voltou. E repeti que não queria. E essa história se repetiu por várias vezes durante a noite, intercalada com sermões sobre eu não querer fazer amigos, e sobre eu não poder ir para não sei onde, no Espírito Santo, porque lá só tocava forró. Valeu a dica, pra eu nunca por os pés por lá mesmo!
O amigo, o tal que parecia uma cópia mal feita do César Cielo, começou a dizer que ele deveria tentar falar em Mandarim, já que “ a japonesinha não estava entendendo o que ele tava falando”. Ai ai ai.
“Ô pé-de-barro do caramba, Mandarim se fala na China. E a China e Japão são dois países diferentes. Incrível, né?”, respondi, com o ar mais prepotente que consegui encontrar.
Meu humor, que já não estava lá em seus melhores dias, acabou de acabar com a demonstração de ignorância capiau.
E o cidadão pareceu gostar da brincadeira de me irritar, porque não parou.
Quando voltou a perturbar, decidi perguntar quantos anos tinha. Ele se assustou e disse que não fazia diferença. “Ué, você não queria conversar comigo? To tentando conversar com você”, disse ironicamente.
“Tenho , 35, e você?”
“Tenho 12 a menos”
“Mas você quer que eu faça conta?”
Aaaaaai, nem preciso falar que a conversa encerrou e fiquei com vontade de dizer que, com aquela idade, ele já devia, no mínimo, ter aprendido a chegar em uma mulher.
Pouco tempo depois, levantei pra comprar uma coca-cola e ele, literalmente, pulou na minha frente e segurou meu braço. Fui seca:
“Tira a pata! Amigão, desencosta agora”.
“Calma, só quero dançar com você”.
“Olha aqui, não to entendendo porque você tá me enchendo o saco, mas se você quiser me irritar, vai ser pior pra você. Quem ta pagando o mico na frente dos amigos, de ficar tomando bota da mesma pessoa a noite inteira é você”, disse e passei.
Mas ele não desistiu. Ao mesmo tempo em que ouvia seus argumentos pela enésima vez, outro cidadão se prestou dizer que seu amigo queria me beijar. Foi a gota d´água! Desabafei irônica:
“Ah, que maravilha, vamos formar uma fila logo pra beijar a menina que veio de São Paulo, vamos pegar senha. Afinal de contas, achei minha boca no lixo mesmo, sabe? Então, todos os nativos, todo mundo que quiser me beijar, fiquem à vontade. Francamente, é assim que funciona nesse fim de mundo?”
Metade da balada caiu na risada e a outra metade ficou com os olhos arregalados. Acho que ninguém esperava essa reação. Que ótimo, afinal de contas, ia acabar a chateação. Que nada!
Já no finalzinho da balada, ele sentou em um banquinho atrás do meu e começou a roçar o pé no meu. Que nojo! Na hora chamei um dos primos, que já nem sabia mais onde estava, e abracei-o.
O cidadão pegou o bando e saiu do lugar. Por um tempo eles ficaram parados na entrada, e eu temi que estivessem esperando pra me bater. Do jeito que os primos da minha amiga estavam, eles não conseguiriam levantar um dedo pra me defender, ia ter de me virar sozinha. Depois de alguns momentos de tensão, o carro chegou e eles foram embora. Fim de noite, carona no bom e velho Gol quadrado, que estranhamente parecia mais confortável. Voltei pra barraca cansada, irritada, mas rindo do que havia acontecido e imaginando o que seria do resto do meu feriado.

3 comments:

Lucy Jones said...

E essa história fica ainda melhor pra quem conhece a autora e sabe que ela realmente disse tudo aquilo!

hahahaha

sensacional!

Patty Marie Jones said...

hahahaha ah, amiga, acho q posso ouvir/ler essa história mil vezes e por mil vezes vou achar fantástica!!!

Bjs

Fábio Félix said...

Nossa, que história sinistra... Exageros de ambos os lados... Hahahaha