Wednesday, April 01, 2009

Quando o peixe foge da água

Não tinha mistério nenhum. Depois de preencher a ficha, a moça só pediu pra voltar e fazer duas horas de teste. E de todos os trocentos bares que já trabalhei aquele era de longe o mais simples. Pra exemplificar, dizia que era como um daqueles botecos do Brasil (coisa que há muito tempo aqui não via), mas hoje achei uma comparação ainda melhor. O nome do lugar terminava como centro social esportivo e recreativo. Um grêmio, bem daqueles que meu pai adora nas cidades vizinhas a São Paulo. O público, por sinal, lembra um pouco aqueles velhos senhores, de jeito simples, sotaque forte e aparência descuidada. Fidelidade e presença diária são recompensadas pelos atendentes, que conhecem todos pelo nome e nem esperam o pedido pra pegar o copo do tamanho preferido e a bebida de sempre.

Assim que entrei, mais da metade dos 20 homens que ocupavam o bar parou pra olhar, mas isso eu já esperava. Não deve ser comum mulher desacompanhda entrar ali. O que eu não esperava é que fosse ver de novo aquele estilo de garçonete. Loira, cabelo comprido até a cintura, nada na parte de cima e só uma pequena tanga na parte de baixo. Mas, dessa vez, não era um aniversário em festa fechada, era num bar, e ela não servia bebida, vendia rifas. Pra quê? Pra carne! O sortudo que fosse sorteado levava pra casa uma bandeja com vários e diferenciados pedaços de carne! Mais ogro, só se eles comessem ali, cru, na hora.

Cheguei e fiquei meio sem graça. O ambiente era ruim, mas ninguém nunca morreu por trabalhar em lugar esquisito, então comecei a fazer o que sei de melhor (pelo menos aqui na Austrália): servir bebidas. Depois da primeira cerveja, já me senti mais em casa. No segundo pedido, entendi o cara queria, abaixei, peguei o copo, fui até a caixa de isopor (!!!) onde eles deixavam o gelo, coloquei no copo, servi a dose de rum e peguei a latinha de coca, já que nem refrigerante de máquina pra misturar com destilado eles tinham. Quando me viro, vejo uma bolinha de papel passando entre o meu quadril e a lata de lixo. Em seguida, o gerente, que nem tinha se apresentado, vem na minha direção e fala sério "fecha o teu zíper, que está aberto!"

O zíper que fica na parte de trás da minha saia estava quebrado e inteiro aberto, deixando à mostra um pedação da minha calcinha. Pra piorar, o balcão ficava no meio do bar, num ambiente mais ou menos parecido com o bar de "O Cheiro do ralo" (a semelhança também está no fato de que, assim como acontecia com a personagem do filme, chamada simplesmente de "a bunda", muitos clientes não entendiam de jeito nenhum meu nome, por mais que eu forçasse o sotaque). Naquele momento fiquei com medo de que a tal bolinha de papel não estivesse direcionada para a lata de lixo. Menos mal que não entrou, nem na lata, nem na saia.

Por mais que eu tentasse, não conseguia fechar. Depois de cinco minutos checando a cada vez que abaixava e tentando cobrir o rombo com a blusa que graça aos céus era semi-comprida, fui até o banheiro e consegui dar um jeito com um elástico de dinheiro que achei dentro do caixa.

Por mais constrangedor que fosse, não vou dizer que não combinava. O bar já tinha os clientes esquisitos, uma mesa pra apostas em corrida de cavalo, o balcão mais grudento que vi na minha vida, uma atendente feia, uma mulher de peitos de fora vendendo rifas, poças d'água dentro do freezer, um isopor pra guardar gelo, garrafas de suco e leite reutilizadas guardando a água que seria dada aos clientes e dois cachorros dormindo na porta. A outra atendente com a saia aberta era a única coisa que faltava naquela cena.

Ficou faltando. Mesmo assim, fui contratada. Por uma semana, até que fiquei amiga dos clientes e briguei com o dono. Daí, não mais.

1 comment:

Carol said...

Visão do inferno...
Fico imaginando como foi a ''situação'' entre vc e o dono...